




Capítulo 1
Duas semanas depois
"Serena, seja rápida, ou você vai se atrasar para a entrevista," minha mãe gritou da sala de estar.
"Estou quase pronta, mãe. Estarei aí em um minuto," respondi.
Olhei para meu reflexo no espelho, pronta para ir para a entrevista.
Por que eu estava indo para uma entrevista, você pergunta?
Desde que o Alfa nos expulsou de casa, eu sabia que precisava arranjar algo para sobreviver. Eu era a única filha da minha família, e tinha que trabalhar duro para poder atender às necessidades da família. Meu pai já estava fazendo alguns trabalhos pequenos, e enquanto o Alfa não o deixava em paz, sempre em seu encalço, ele nunca escolheu parar de trabalhar para o monstruoso Alfa, apesar de não ser um Gamma na matilha.
Eu era a desgraça sem lobo da matilha, que tinha que obedecer a tudo que me ordenavam, e que era uma maldição para meus pais. Eu não tinha um lobo e era considerada uma humana nesta cidade.
Nossa cidade de lobos, a Cidade do Vale Carmesim, era uma das cidades mais perigosas do mundo. Era dominada por lobisomens, e geralmente era uma bagunça sangrenta, mas também havia alguns humanos tentando compartilhar nossos recursos e não causar problemas. Há muito tempo, os humanos escolheram viver pacificamente entre nós, sem interferir nas matilhas e nos territórios, mas trabalhavam entre nós.
Era muito difícil sobreviver, especialmente se você fosse fraco, e por mais que eu desprezasse isso, não podia fazer nada a respeito. Isso só me fazia viver em arrependimento todos os dias da minha vida, vivendo na dor constante de ser o mais baixo da hierarquia, sem poder fazer nada ou tomar decisões por mim mesma.
Eu não era nem mesmo uma Ômega, ainda, o fato de eu não ter me transformado ou descoberto meu lobo só me classificava como uma - talvez até menos que uma Ômega. Eu sempre quis três coisas – um lobo, um parceiro, e uma vida feliz, mas nenhuma delas veio ao meu encontro.
Nossa matilha, a Matilha Violeta Encantada, era apenas moderadamente poderosa, e o Alfa agia como se fosse dono do mundo. Não é à toa que ele sempre tinha problemas com matilhas rivais.
Sacudindo os pensamentos da minha cabeça, olhei para o espelho, admirando minhas ondas de praia, com um toque de luzes caramelo. Eu não me sentia tão confiante como me sentia há muito tempo, já que o que envolvia minha vida era miséria.
Virei, peguei minha bolsa e coloquei a última garrafa de óleo de fragrância nela. Pendurei-a no ombro enquanto caminhava para fora.
A casa em que vivíamos agora era uma bagunça. Eu costumava pensar que o lugar precário em que ficávamos na nossa matilha era realmente ruim, até o Alfa nos forçar a ficar nesta casa podre, afetada pelo envelhecimento. As tintas das paredes estavam descascando, as tábuas do chão rangiam a cada passo que alguém dava, e todas as janelas estavam quebradas, enquanto as persianas estavam caídas. Era nada além de um apartamento decadente, onde um ar de umidade e desolação era a única coisa que se podia respirar.
E o pior de tudo era que o cruel Alfa nos fazia pagar por viver ali. Se não pagássemos, ele ameaçava nos jogar nas ruas, vulneráveis a ataques de renegados famintos e lobos perigosos em busca de carne sob o luar. Mesmo que meus pais pudessem se proteger, eu não podia. Tudo apontava que eu era um fardo na existência deles.
Tranquei a porta atrás de mim e caminhei até a sala de estar. Minha mãe já estava lá esperando, com um sorriso no rosto, e eu sabia que ela tinha grandes esperanças para mim.
"Finalmente você chegou. Deus sabe quanto tempo você ia demorar," ela disse e suspirou.
"Eu só tive que passar um pouco de maquiagem. Consegui algumas da Everly. Não sei como ela conseguiu, mas ela me deu." Não exibia uma expressão de culpa, achando que minha mãe iria me atacar. Everly era a única amiga que eu tinha desde criança, e ela era a única que me apoiava quando as outras garotas da matilha tentavam me atacar.
Minha mãe mostrou um olhar preocupado. "Mas você sabe que o pai dela é um Gamma. Quando o Alfa descobrir que você tem algo a ver com ela, ele não vai gostar, e isso pode causar problemas na matilha," ela disse.
"Não precisa se preocupar, mãe," eu disse, segurando suas bochechas para aliviar a tensão que devia estar passando por ela.
Eu a encarei, olhando para mim com tristeza nos olhos. Eu sabia que minha mãe não estava feliz, mas estava tentando disfarçar com um bom semblante.
Eu olhei profundamente nos olhos ônix dela. Esses eram a única coisa que eu não herdei dela. Bem, não que eu tenha herdado tudo dela de qualquer forma.
Ela não era minha mãe verdadeira, mas eu a considerava como tal. Minha mãe verdadeira havia morrido em um ataque de uma matilha estrangeira. Eu não vi seu rosto, nem me lembro como era, a única memória que tenho da sua morte é a imagem borrada de seu corpo frio deitado ao longe. Então, fui para os braços da minha madrasta, que na época era uma amiga próxima da minha mãe. Ela cuidou de mim por muito tempo, e depois, meu pai se casou com ela.
"Está bem, Serena. Eu acredito em você," ela disse, me tirando dos meus pensamentos.
Eu sorri para ela, e ela retribuiu, seus lábios se curvando em um belo sorriso. Eu amava tudo sobre ela, seu rosto, seu sorriso, e desejava ter seus poderes também.
Eu me virei, pegando o copo de água na mesa. Eu sabia que era a única coisa que eu tinha para preencher meu estômago, já que não havia nada na casa, pois éramos pobres demais para sequer comprar comida, enquanto o Alfa cortava nossa alimentação da matilha, com a exigência de pagar pela comida se quiséssemos obter comida cozida dos aposentos dos Ômegas.
"Onde está o papai?" eu perguntei, depois de virar o copo de uma vez. A sensação era gelada, aliviando a tensão que se espalhava por todo o meu corpo.
"Seu pai foi encontrar o Alpha," ela respondeu secamente.
Eu sabia que algo estava errado. Virei-me e vi que ela estava olhando para outro lugar.
"Ele foi implorar ao Alpha de novo?"
"Sim, Serena. Ele tem implorado sem parar, mas o Alpha Pedro não quer que voltemos para a casa da matilha. Ele diz que você trará sua maldição para todos se voltar," ela disse, com tristeza na voz.
Isso só me fez odiar mais o Alpha. Nem pensei nisso, porque sabia que ele era tão cruel.
"Diga ao pai para parar de ir ao Alpha. O ego de Pedro só vai inflar se ele continuar implorando para voltarmos," eu disse a ela.
Ela parecia discordar pela expressão facial. "Você sabe que essa é a única maneira de sobrevivermos. Dependemos da matilha há tanto tempo," ela falou.
"É por isso que eu quero esse emprego. Ouvi dizer que é de bilionários e pode ter um salário alto. Se eu pudesse ser recepcionista, ou talvez secretária, então poderíamos viver bem," eu disse.
"Você não me contou sobre o emprego, Serena. Do que se trata essa empresa?"
"Não se preocupe, mãe. Vou voltar com boas notícias," eu a assegurei.
Ela confiou na minha palavra. "Boa sorte," ela disse e beijou minha testa.
Eu dei um sorriso leve, enquanto saía de casa. Ao sair, a brisa da manhã atingiu meu rosto. Eu costumava me mover com cuidado para não encontrar um dos guardas da matilha, ou talvez alguém que eu conhecia da matilha. Isso só causaria mais constrangimento e um motivo para me envergonhar ainda mais.
Não era longe até chegar à cidade, depois de pegar um táxi assim que passei pelas fronteiras da matilha. Não tive problemas com os guardas nas fronteiras, já que, como sentinelas, eles não estavam tão familiarizados com o que acontecia na casa da matilha e não me reconheciam.
"Aqui. Me deixe aqui," eu disse ao motorista.
Dando-lhe o pagamento, saí do carro e olhei, maravilhada com o que estava na minha frente.
Vários metros à frente, um edifício colossal. O prédio parecia perfurar o céu. Fontes de água de cada lado do caminho que levava à entrada principal, a única coisa que eu podia ver eram as incontáveis janelas em cada andar, e eu imaginava quantos escritórios haveria.
Havia uma grande placa que podia ser lida de longe – H.A.C CONSORTIUM. Embora eu não soubesse o que significava a sigla, só sabia que havia pessoas extremamente ricas lá dentro.
Passando pelos guardas, fui até a recepcionista. Ela era uma jovem loira, não tinha mais de vinte anos, pelo que eu via, e como se soubesse que eu estava chegando, tinha os olhos fixos em mim, com olhos brilhantes e um sorriso acolhedor no rosto.
"Bom dia," eu cumprimentei.
"Bom dia, como posso ajudar?"
"Eu sou Serena Carlton, que se candidatou a uma vaga aqui, e me disseram para vir hoje," eu disse.
Ela olhou para baixo, talvez para um arquivo ou qualquer coisa que fosse, e então voltou a olhar para mim. "Sim. Eu posso ver seu nome aqui. Pegue o elevador ali, e quando chegar ao próximo andar, a secretária lá vai te direcionar sobre o que fazer," ela disse.
Eu sorri e assenti. Virando-me, fui rapidamente em direção ao elevador. Não queria me atrasar para a entrevista. Entrei, apertei o botão para o próximo andar, quando de repente, uma mão apareceu entre as portas, e a porta se abriu. Levantei a cabeça, olhando para quem devia ter parado, e fiquei surpresa ao ver quem era.
Ele tinha cabelo grosso e olhos cor de âmbar bonitos, e estava me olhando como se estivesse culpado. Um cheiro muito forte me atingiu. Enquanto eu pensava que ele era um lobisomem, duvidava da possibilidade de lobisomens trabalharem aqui. Era uma empresa bilionária, e eu só podia assumir que humanos a operavam.
Ele me encarou, sem desviar os olhos, enquanto entrava no elevador. Era como se algo estivesse errado, mas eu sabia que não era bonita o suficiente para ele continuar me olhando. Comecei a ficar desconfortável, e quando olhei para ele de forma incisiva, ele entendeu a mensagem, e meu olhar parecia tirá-lo do desconhecido.
Fechei os olhos. A única coisa que eu podia ver era o rosto dele. Olhos cor de âmbar, lábios bonitos, e...
Meu Deus! Eu estava aqui para uma entrevista! Eu tinha totalmente esquecido disso. Não demorou muito, apenas segundos, antes de chegarmos ao próximo andar. Segundos que pareceram muitas horas. Eu não via a hora de sair correndo desse elevador.
Imediatamente, entrei no andar e fui em direção à mulher na mesa.
"Bom dia, senhora, como posso ajudá-la?" Ela perguntou, assim que cheguei perto dela.
"Serena Carlton. Eu me candidatei a uma vaga, e me disseram para vir hoje," eu disse.
Ela pareceu entender. "Ah, sim. Vá até aquele assento, outros estão esperando..." Ela fez uma pausa, e eu me perguntei o que estava errado. Não precisei ponderar mais, pois virei para olhar quem estava atrás de mim.
Parecia que todos os homens aqui eram deuses. Outro cara bonito atrás de mim.
"Uh... Jace?"
"O chefe solicita ver os candidatos," o jovem disse, em um tom firme.
"Sim. Eles estão lá, esperando. Se você puder, pode..."
Ela fez outra pausa, e eu olhei para Jace, como ela o chamou. Seus olhos me escanearam completamente antes de ele ordenar.
"Entre no escritório. O chefe quer te ver," ele ordenou.
Eu queria perguntar se ele realmente estava falando comigo.
"Mas... há outros que vieram..."
"Rápido," ele disse, olhando para mim.
Eu me perguntava por que ele era assim, mas parecia ter uma aura forte.
Voltei meu olhar para a mulher.
"Vá. O Alfa quer te ver," ela disse. Meu queixo caiu, e meu estômago afundou ao ouvir a declaração. O quê?!
Alfa?
Não pode ser que um Alfa seja dono da empresa!