




Capítulo 4: Penny
A sala de aula já está quase cheia quando eu entro discretamente.
O burburinho das conversas meio adormecidas, o arrastar das cadeiras no piso de azulejo, o baque das mochilas cheias batendo no chão—nada disso diminui por minha causa. Eu ajusto a alça da minha mochila no ombro e procuro um lugar vazio.
Só tem um.
Fila do meio, segunda cadeira do final.
Ao lado de um cara que parece familiar do jeito que a maioria dos colegas de time do Tyler parece—ombros largos, suéter da escola, boné virado para trás como se tivesse saído direto de uma montagem heroica de esportes.
Jonathan, acho.
Talvez.
Eu me sento, tentando não fazer barulho. Ele levanta os olhos do caderno e me dá um sorriso rápido e fácil—do tipo que diz “ei, sou uma pessoa legal, você pode sentar aqui sem se arrepender”—e então volta a rabiscar sem muito entusiasmo.
Sem zombaria. Sem os olhares de desdém da Rebecca. Sem drama.
É... estranhamente desarmante.
Eu olho para a frente da sala, onde o professor já está começando a explicar sobre redações comparativas como se todos estivéssemos desesperados para saber. Meu caderno permanece fechado na minha mesa. Minha caneta fica sem uso. Meu cérebro se recusa a funcionar.
Eu odeio essa sensação.
Odeio quando meu dia começa mal.
Nunca consigo dar a volta por cima. É como ser empurrada para fora do equilíbrio logo de manhã e depois tropeçar em tudo pelo resto das próximas doze horas. Eu quero me concentrar. Quero esquecer a Rebecca, a Zoe e a estranha decepção que ainda me aperta depois de falar com o Tyler.
Eu não deveria estar com raiva do Tyler.
Eu sei disso.
Ele só estava tentando ajudar a Zoe. Ele não pediu para ela ficar lá e rir de mim. Ele não sabia.
Mesmo assim.
Mesmo assim.
Eu prendo uma mecha de cabelo atrás da orelha e foco intensamente em um ponto na parede, tentando fazer com que as lembranças venham mais suaves desta vez.
Tyler.
Quando nos conhecemos, foi fácil.
Estupidamente fácil.
Ele se mudou para o bairro pouco antes do semestre de primavera do ano passado. Os pais dele compraram a velha casa branca a três ruas de distância, aquela com o balanço da varanda quebrado e as persianas azuis descascando. Lembro-me de passar de bicicleta e ver as caixas empilhadas no gramado, a mãe dele na varanda gritando instruções para os carregadores como uma general.
E Tyler.
Encostado no batente da porta, boné de beisebol puxado para baixo, fones de ouvido enrolados no pescoço, um pouco queimado de sol como se ainda não tivesse percebido que o sol da Flórida não é brincadeira.
Ele sorriu quando me viu olhando.
Não foi um sorriso presunçoso. Não aquele sorriso ensaiado que eu tinha aprendido a evitar nos garotos.
Algo mais suave.
Quase tímido.
Não demorou muito depois disso. Alguns encontros “acidentais” no supermercado, algumas voltas de bicicleta sem destino, e então simplesmente... aconteceu.
Começamos a sair juntos do jeito que as pessoas começam a respirar depois de muito tempo debaixo d'água.
No começo, ele não conhecia ninguém. Era só ele e eu e as calçadas tranquilas do nosso bairro se estendendo como se tivessem sido feitas para nós.
Mas não ficou assim.
Tyler fez amigos rápido. Os técnicos praticamente se atropelavam para tê-lo em seus times. Futebol, basquete, qualquer coisa com uma bola e um placar, ele arrasava sem esforço.
E as garotas perceberam também.
Eu percebi elas percebendo.
O jeito que riam um pouco alto demais perto dele. O jeito que puxavam as mangas quando ele passava. O jeito que tocavam no braço dele sem necessidade.
Eu odiava isso.
Ainda odeio.
Mas o Tyler nunca me deu motivo para duvidar dele. Ele sempre voltava para mim. Sempre me escolhia primeiro.
Ele foi meu primeiro beijo.
Meu primeiro namorado de verdade.
Meu primeiro tudo, na verdade.
E eu o amava.
Acho.
Quer dizer, o que mais isso poderia ser? A maneira como meu peito fica mais leve quando ele está por perto. Como ainda fico nervosa antes de vê-lo, mesmo depois de todo esse tempo. Como ainda quero que ele me veja—realmente me veja—quando acerto uma nova rotina ou quando rio de uma das suas piadas idiotas.
É amor.
Tem que ser.
Certo?
Bato a ponta da minha caneta contra a mesa, tentando me livrar desse sentimento.
Não funciona.
Jonathan—Jo?—rabisca algo nas margens do seu caderno. Consigo dar uma olhada.
Um desenho terrível de um cachorro. Ou um cavalo. Ou uma lhama profundamente amaldiçoada.
Antes que eu possa me questionar, cutuco o braço dele com o cotovelo e sussurro: "Isso é para ser um cachorro? Ou você está fazendo uma declaração sobre evolução?"
Ele me olha, surpreso.
Então ele ri.
Não uma risada falsa. Não uma risada educada.
Uma risada real, baixa, surpresa que faz algumas pessoas se virarem em seus assentos.
Ele sorri e vira o caderno para mim, revelando um desenho ainda pior embaixo—um boneco de palito montando o animal misterioso, segurando uma xícara de café como uma espada.
"Arte," ele diz seriamente. "Você não entenderia."
Dou uma risadinha. "Você está certo. O verdadeiro gênio é sempre incompreendido em seu tempo."
Ele ri de novo, balança a cabeça e volta a olhar para o professor, ainda sorrindo.
E assim, a tensão no meu peito diminui um pouco.
Não completamente. Mas o suficiente.
O suficiente para lembrar que nem todo mundo neste prédio me odeia. O suficiente para lembrar que, às vezes, um desenho bobo e uma piada mais boba ainda são suficientes para fazer uma manhã terrível parecer um pouco menos permanente.
O resto da aula passa mais rápido do que eu esperava.
Anoto algumas notas meio coerentes. Principalmente desenhos meus. Uma bailarina de palito enfrentando um monstro-cavalo de palito com uma bandeirinha que diz socorro.
Jo me pega uma vez, levanta uma sobrancelha e sorri de lado.
Eu sorrio de volta.
Não é nada.
Não é importante.
Mas é alguma coisa.
O professor nos dispensa mais cedo—um milagre raro—e eu coloco minhas coisas na mochila com mais energia do que comecei. Jonathan também se levanta, jogando a mochila sobre um ombro.
Estou quase saindo pela porta com ele quando vejo Tyler.
Ele está encostado na parede do outro lado do corredor, mãos enfiadas nos bolsos da jaqueta, olhos escaneando a multidão.
No segundo que ele me vê, se endireita.
Seu rosto muda para aquele sorriso familiar—aquele que costumava me desmontar sem nem tentar.
“Oi,” ele diz, se afastando da parede e se movendo entre os retardatários para me alcançar. Seus olhos piscam brevemente para Jonathan, depois voltam para mim.
Sinto Jo olhar entre nós, e por uma fração de segundo, o ar parece... mais pesado.
"Te vejo por aí, Vale," Jo diz, casual, me dando um rápido cumprimento com dois dedos.
Consigo dar um pequeno sorriso. "Até mais, Picasso."
Ele ri baixinho e desaparece pelo corredor, me deixando sozinha com Tyler.
Ty se aproxima, mãos ainda nos bolsos, ombros um pouco curvados como se estivesse tentando parecer menor do que é.
“Queria te acompanhar até o almoço,” ele diz. “Se estiver tudo bem.”
Está.
Deveria estar.
Eu aceno. “Claro. Claro que sim.”