♥ Capítulo 1 ♥
Yara Blake.
12:20. "Casa da Yara." Eldoria.
Sexta-feira.
Estou parada em frente ao espelho, olhando meu reflexo. A imagem do meu vestido de noiva ainda está fresca na minha mente, um lembrete cruel do dia em que minha vida mudou para sempre. Por um momento, perco-me nas memórias daquele casamento infeliz, acreditando que tudo melhoraria com o tempo. Achei que, eventualmente, me apaixonaria por Ronan e ele por mim. Mas isso não aconteceu.
Desde o dia em que nos casamos, ele nunca me tocou. Não consumamos nosso casamento na lua de mel. Suas palavras ainda ecoam na minha mente: "Você não serve para mim." Desde então, minha vida se resume a cumprir minhas obrigações domésticas e ser uma boa esposa, do jeito que ele acha que eu devo ser.
Ele constantemente joga na minha cara que eu só tenho ele na minha vida e que devo obedecê-lo sem questionar. Quando tentei falar com minha mãe na esperança de encontrar algum consolo, ela ficou do lado dele. Disse que eu deveria sempre abaixar a cabeça para meu marido, que é o que uma esposa deve fazer.
Estou cansada disso. Casei-me aos dezoito anos, e agora, aos vinte e dois, esses quatro anos têm sido um inferno. Além disso, tenho medo de pedir o divórcio e ele me machucar. Conheço bem sua verdadeira personalidade, escondida atrás de uma fachada de respeito e polidez.
Hoje acordei cedo para preparar o café da manhã para Ronan, como faço todos os dias. Mas agora estou no banheiro, terminando de me arrumar para a entrevista. Minha mente está focada no que essa nova oportunidade pode significar para mim. A entrevista será surpreendentemente na empresa do Sr. Magnus, algo que descobri pelo jornal que consegui ler.
Foi difícil, mas liguei para o número do anúncio do nosso telefone fixo. Surpreendentemente, a mulher que atendeu foi muito gentil e me deu todas as informações de que eu precisava: o endereço, a hora da entrevista e até disse que eu não preciso de um currículo, apenas meu RG, porque serei entrevistada pelo próprio Sr. Magnus.
Ouvi dizer que a Sra. Darkmore tem três filhos: Magnus, Kael e Damien. Só conheço os nomes deles porque os pesquisei discretamente, mas não consegui encontrar fotos ou informações nos jornais. Meu marido não me permite ter um celular, e qualquer contato com o mundo exterior é controlado por ele.
Surpreendentemente, ele me deu permissão para tentar essa entrevista. Acho que o status da família Darkmore influenciou sua decisão. Se fosse em algum lugar mais humilde, ele nunca teria permitido. Ele acredita que, trabalhando para uma família rica e poderosa, minha lealdade a ele só aumentará.
Aqui estou eu, em frente ao espelho, ajustando os últimos detalhes da minha aparência. Dou uma última olhada no meu reflexo, certificando-me de que não tenho olheiras visíveis e que minha roupa está adequada. Hoje, estou vestida com uma roupa simples, mas decente: uma blusa de algodão branca e uma saia preta até o joelho. A blusa é básica, com um decote em V discreto e mangas curtas, enquanto a saia tem um tecido leve e fluido que cai suavemente. Apesar da simplicidade, o conjunto está bem arrumado e me faz sentir um pouco mais confiante.
Aplico um pouco de maquiagem para disfarçar meu palor e garantir que estou apresentável. O esforço é mínimo, mas é o melhor que posso fazer com o que tenho. Olho novamente no espelho e sinto uma mistura de nervosismo e esperança.
Saio do banheiro, pego minha bolsa com os documentos e começo a descer as escadas. Felizmente, Ronan deixou dinheiro para o táxi, que só cobrirá a ida e a volta. Se eu sentir fome durante o dia, não poderei comer nada, pois o dinheiro disponível é exatamente o necessário para o transporte.
Chego ao último degrau e respiro fundo antes de sair de casa. Hoje, tenho uma chance de mudar minha vida, e não posso deixar essa oportunidade escapar. Coloco o dinheiro no bolso e saio, determinada a dar o meu melhor na entrevista.
Por sorte, vejo um táxi se aproximando. Faço sinal, e ele para rapidamente. Entro no veículo e dou ao motorista o endereço da empresa dos Darkmore. Enquanto o táxi percorre as ruas, meu coração está acelerado.
Estou tão ansiosa para conhecer novas pessoas e interagir com alguém fora do meu círculo restrito. As únicas pessoas com quem falo são meus pais e meu marido. Ronan restringe muito meus passos; ele até vai às compras comigo. Por que ele tem essa obsessão em me trancar? Não posso ter amigos, e não posso falar com ninguém além dele e da minha família.
Tenho certeza de que Ronan está me traindo. Está se tornando cada vez mais óbvio. Ele chega em casa do trabalho com um cheiro diferente, e já encontrei marcas de batom em suas roupas. Uma vez, confrontá-lo sobre isso só me trouxe mais dor. Perguntei sobre as evidências que encontrei, mas em vez de uma resposta, recebi um tapa no rosto que ficou roxo por quase uma semana. Como minha pele é clara, qualquer marca se torna visível e dura um tempo.
Esses sinais de traição, junto com a violência e o controle, fazem minha vida parecer ainda mais opressiva. Sinto-me presa e sem opções. No entanto, essa entrevista pode ser minha chance de mudar tudo isso. Posso sair mais, interagir com novas pessoas, e talvez elas possam me ajudar a escapar desse casamento. Se eu conseguir o emprego, minha vida pode começar a se transformar, e a oportunidade de encontrar uma saída pode finalmente se materializar.
"Chegamos." O motorista me diz.
Saio do meu transe e olho pela janela. A cidade parece tão distante, e o enorme prédio à minha frente se destaca entre os outros.
"Obrigada." Agradeço, puxo minha bolsa para pegar o dinheiro e pago pela corrida.
Ele me entrega o troco, e eu saio do carro, sentindo o ar frio e fresco no meu rosto. Pego minha bolsa e olho para o enorme prédio à minha frente. O edifício é imponente, com janelas escuras que refletem a luz do sol e uma entrada elegante que parece quase inacessível.
Fecho os olhos por um momento e conto mentalmente até dez, tentando acalmar o turbilhão de emoções dentro de mim. Quando abro os olhos novamente, respiro fundo e sussurro para mim mesma:
"Estou pronta."