




4: Tumbleweed
A noite havia perdido toda a vida e estava completamente silenciosa. Um punhado de mendigos eram as únicas pessoas que se mantinham na estrada naquela hora e mesmo eles, não por escolha. Holbrook se tornava um dos lugares mais perigosos do mundo em noites tão escuras. O crime corria solto nas primeiras horas da madrugada. As pessoas não hesitavam em dar uma facada ou duas por alguns trocados. Até os mendigos aparentemente adormecidos eram uma ameaça. A maioria deles eram viciados, as coisas que faziam para conseguir um pouco da droga eram indescritíveis. A longa extensão de rodovias ao redor da cidade também era a razão pela qual a cidade parecia tão deserta. Por menor que fosse, toda a vida ainda estava nos becos onde tudo ficava fora de vista. A área ficava longe da região densamente povoada do Arizona, então apenas um ou dois veículos estranhos circulavam pelas estradas e mesmo assim por meros segundos. Qualquer carro que estivesse prestes a chegar no cruzamento, podia ser ouvido a centenas de metros de distância. Tal era o silêncio. O crime ainda era o segundo pior inimigo. O calor estereotipado do Arizona era suficiente para cozinhar uma pessoa ao ponto em dez minutos. À noite, cada quarto se tornava uma sauna. O Diamond Boot Bar ficava bem na entrada da estrada deserta. O bar não tinha muita frequência nas horas normais, então era certo que estaria tranquilo às três da manhã. O bar era o mais barato em dez quarteirões, então o público que tinha não era do tipo elegante que se importava muito com etiquetas. O único veículo estacionado no estacionamento era uma moto que pertencia ao barman. Não era uma Harley Davidson, mas uma daquelas motos japonesas descontinuadas que eram procuradas antigamente. Fazia o trabalho bem o suficiente para colocar comida na mesa de seu dono. Dentro do bar, apenas meia dúzia de homens de meia-idade, fortemente embriagados, permaneciam sentados. Bem, mal se podia chamar aquilo de estar sentado. Eles tinham conseguido se equilibrar bem o suficiente para evitar uma queda embaraçosa. Todo o espaço era fracamente iluminado com luzes amareladas que faziam o lugar parecer que tinha viajado no tempo direto dos faroestes. A jukebox tocava baixinho como a banda no Titanic afundando. "É um novo dia com você ao meu lado!" ou algo assim de pelo menos três décadas atrás. No estado em que a máquina estava, era nada menos que um milagre que ainda funcionasse.
O barman, que parecia ter vinte anos e ser educado o suficiente para estar fazendo algo melhor, havia servido a última bebida meia hora atrás. Ele era branco, com a cabeça cheia de cabelos pretos que caíam no rosto. Vestia uma camiseta preta com o emblema de alguma banda de death metal que mais parecia um esboço a lápis de um arbusto aleatório. Ele limpava o balcão com um pano úmido, esperando que as últimas horas de seu turno passassem. Um homem branco idoso, bêbado demais para andar dez pés, tropeçou pelo bar, causando um terremoto, e encontrou o balcão para salvá-lo da força brutal da gravidade. O barman o observou enquanto limpava o perímetro. O homem passou as mãos ao redor e se guiou até um banquinho do bar.
"Que tal mais uma para a noite?", o velho mal conseguiu produzir as palavras entre seus grunhidos e os outros sons que sua boca dormente fazia enquanto tentava falar. O olhar no rosto do jovem barman claramente lhe disse que ele não conseguiria mais nada. "Me dá mais uma ou eu destruo esse buraco!", o velho ameaçou e o barman não pôde deixar de sorrir.
"Olhe ao seu redor, Ben. O lugar já está no fundo do poço. Vai precisar de um esforço para piorar", respondeu o barman, e o velho concordou. Ele ficou em silêncio e descansou a testa no braço sobre o balcão. "Vou chamar um Uber para você", disse o barman enquanto limpava os copos com um guardanapo. O velho grunhiu em concordância. O barman chamou um Uber. Ele voltou a limpar o balcão como deveria fazer no final do seu turno. A porta rangeu suavemente ao abrir. O barman meio que esperava ver um bêbado babando entrando. Ele ficou surpreso ao ver um homem negro de meia-idade, bem vestido, carregando uma maleta preta. Ele usava um chapéu fedora sobre um sobretudo, como em um daqueles filmes de espionagem dos anos 1940. Ele se sentou na extremidade mais distante do balcão e colocou sua maleta à sua frente. O barman continuou cuidando dos canecos de vidro que raramente eram usados, mas que tinham sido usados na festa mais cedo naquela noite. Ele antecipou um pedido que nunca veio. Nem mesmo um contato visual. Aquele homem apenas tirou alguns papéis de sua maleta e os leu, alheio à destruição ao seu redor. O homem negro acariciava seu queixo barbeado a cada minuto ou mais, mantendo os olhos no papel. Ele olhou para o velho cochilando no braço. Observou-o por alguns segundos e voltou aos seus papéis. O balcão estava limpo agora e o barman não tinha muito mais para limpar, então ele se sentou no único banquinho do outro lado do balcão. Seu telefone vibrou. Era o Uber. Ele acordou o velho gentilmente. O bêbado não queria, mas se levantou depois de um momento de persuasão. Ele foi ajudado a sair e entrar no carro. O velho agradeceu e o barman sussurrou o endereço ao motorista. Assim que terminou com o velho, ele voltou para o prédio. Ele viu o homem de sobretudo olhando diretamente para ele. Ele já tinha visto sua cota de esquisitos, mas esse era diferente. O homem relutantemente desviou o olhar assim que percebeu que o barman o observava. As dúvidas do barman se transformaram em fatos. O homem estava ali para vê-lo. O barman manteve a calma e voltou para trás do balcão. Ele pegou um copo já limpo e o poliu ainda mais com um guardanapo, tentando parecer ocupado.
"Última hora, grandão! Não sei se o novato vai aparecer para o turno dele. Então, receio que você vai ter que falar mais alto", disse ele sem levantar os olhos do copo que estava prestes a perder uma camada devido à esfregação excessiva. O cara do sobretudo olhou para trás, para o punhado de bêbados espalhados pelas mesas ao longo das paredes, e voltou a inspecionar os papéis. "Oh! Um tímido em Holbrook!", pensou o jovem. Se fosse o caso, ele não tinha escolha a não ser esperar até que o homem reunisse coragem suficiente para pedir algo e ir embora. Ele ia ficar sentado sem fazer nada por uma hora de qualquer maneira.
"Esses caras todos têm alguém vindo buscá-los", ele meio que confortou seu potencial cliente. O homem estava parecendo cada vez mais suspeito a cada segundo que passava. Ele começava a parecer inquieto. Se fosse um assaltante, tinha a oportunidade ideal. Um jovem sozinho atrás do balcão, que não tinha nenhum interesse no estabelecimento, então não lutaria, um bando de bêbados que não notariam nem se uma bomba explodisse. Mesmo assim, ele deixou todas as oportunidades passarem. A sensação de estranheza estava gradualmente sendo substituída por curiosidade, mas, novamente, o sobretudo era grande o suficiente para esconder um bazuca se o homem quisesse causar problemas. A porta rangeu apressadamente e um jovem de jaleco entrou no bar. Parecia que estava a caminho de casa, mas teve que fazer um desvio indesejado. O barman reconheceu o homem, ele era o único filho do velho que roncava esparramado sobre uma mesa que parecia frágil demais para suportar seu peso. O filho estava lá para buscá-lo. Assim que estava ajudando seu pai a se levantar, a porta se abriu novamente e desta vez era uma garota que estava lá para buscar o marido. "Pobre garota!", pensou ele. Um após o outro, todos os bêbados espalhados pelo bar foram buscados por seus entes queridos e o barman e o homem negro de sobretudo ficaram sozinhos. O homem estava fazendo um show patético, fingindo cuidar de seus próprios negócios. Ele foi pego várias vezes tentando roubar olhares. Não era mais segredo que ele estava esperando o bar esvaziar e sua espera agora havia terminado. O barman segurou um taco debaixo do balcão, aguardando o primeiro movimento.
O homem finalmente olhou ao redor para se certificar de que o lugar estava deserto, dobrou os papéis e os colocou na maleta. O aperto no cabo do taco foi ainda mais apertado. Ele se moveu para o banquinho mais próximo do barman e se sentou lá. Seus olhos se encontraram. O barman estava longe de estar com medo. Os olhos do homem de sobretudo mostravam desespero, mas, novamente, todos os assaltantes têm seus momentos de autorreflexão antes de puxar o gatilho. Mas havia algo mais, o jovem barman não conseguia identificar. Seus pensamentos mudaram assim que ele percebeu. Era reverência.
"Você precisa se mudar", o homem negro sussurrou suas primeiras palavras, olhando para a alma do jovem. O barman ficou petrificado. O homem acabara de atingir o jovem com uma bomba e estava recolhendo suas coisas do balcão para sair. O taco não estava mais sendo segurado.
"Espere! O que eu faço agora?", o barman protestou e correu para fora da pequena porta de mola no canto da estação de trabalho. O homem tinha se levantado e saiu apressadamente pela porta. O jovem entrou em pânico, tentando contemplar seu próximo curso de ação. Depois de desperdiçar um ou dois minutos em paralisia, ele avistou um objeto branco no balcão. Ele se recompôs e descobriu que o informante havia deixado um pedaço de papel. As poucas palavras que ele leu indicavam que o papel foi deixado deliberadamente para ele ver. Ele rapidamente correu para dentro e limpou o estabelecimento de seus pertences. Ele saiu dos quartos internos com uma pequena mala e um capacete. Ele trancou o prédio por fora.
O céu estava coberto por nuvens escuras o dia todo. As nuvens inchadas finalmente começaram a se romper. Fracos pingos de chuva ecoavam ao tocar no grande outdoor próximo. O volume da chuva podia ser medido em frente às luzes piscantes do outdoor. Ele montou sua moto e partiu para a rodovia que ficava a uma curta distância do bar. O asfalto brilhava com as gotas de chuva e o motociclista sabia que as estradas eram as mais traiçoeiras em chuvas que eram longas o suficiente para trazer à tona os óleos absorvidos, mas não longas o suficiente para lavá-los. O motociclista manteve a moto devagar para segurá-la firme caso escorregasse. As gotas de chuva gradualmente ganharam peso. Após um estrondo de trovão, a chuva aumentou para sua força total. As dúvidas do motociclista foram removidas. Ele fechou a viseira do capacete e acelerou em seu caminho.