




O inimigo
POV do Dan
Não consigo tirá-la da cabeça. A garota da floresta. A garota da alcateia Shadowwood. A inimiga.
Já a vi antes, claro. Na escola, na cidade, nas notícias. Ela é Elena Stormfang, a filha do alfa rival. A herdeira do clã sombrio e perigoso que se esconde nas sombras da floresta.
Mas isso é diferente. Ela está sozinha, exposta, assustada. Seus olhos dourados se movem rapidamente, procurando uma fuga ou uma ameaça. Seu cabelo castanho cai sobre o rosto, escondendo sua expressão. Seu corpo esguio se tensa, pronto para correr ou lutar.
Sinto algo quando a vejo. Algo que não consigo explicar. Algo que não deveria sentir.
Respiro o cheiro terroso e almiscarado da floresta Silverwood. O ar está fresco, com um toque de outono. Estou entre as árvores altas, sentindo a casca áspera como pele envelhecida. O sol filtra pelas folhas, criando luz e sombra no chão. É um mundo de crepúsculo, onde o sol mal alcança o solo da floresta.
Caminho sobre um tapete de folhas, que estalam sob meus pés. Elas são carmesim, âmbar e douradas – as cores do fim do verão. A brisa toca meu cabelo e minha pele, e o cheiro de terra e decomposição enche meu nariz. É um perfume que só existe em Silverwood.
Ouço um riacho ao longe, murmurando com o vento e as folhas. A floresta está viva com sons – uma coruja, esquilos, pássaros. Sinto-me em casa aqui, com minha alcateia e minha terra. Conheço todos os segredos e caminhos dessas matas. É um mundo de beleza e perigo, onde a lua brilha e as sombras escondem ameaças.
Em Meadowville, nossa cidade no meio da natureza, os lobisomens têm uma comunidade e um entendimento. Sobrevivemos em um mundo que pode não nos aceitar.
Mas não podemos esquecer a alcateia de Elena, nossos rivais além de Silverwood. Sua presença é uma sombra sobre nós, um lembrete de um passado de conflitos e batalhas. Coexistimos, mas não confiamos uns nos outros. A tensão está sempre lá, esperando uma faísca.
Neste mundo de lobisomens, encontro consolo e identidade. Silverwood e seus segredos estão na minha alma, e toda vez que exploro suas profundezas, sinto a selvageria em mim – a mesma selvageria que corre pela minha alcateia.
Olho ao redor e vejo os membros da minha alcateia. Minha família.
Lá está Luna, a curandeira bondosa e perceptiva da alcateia. Ela está sempre cuidando dos feridos ou doentes, usando seus dons naturais e remédios herbais.
Lá está James, o ômega travesso e imprudente que frequentemente se mete em situações engraçadas. Ele está sempre procurando diversão ou encrenca, dependendo da minha perspectiva. Orion é ousado, destemido e sempre em busca de novos desafios e emoções, e há Marcus, meu melhor amigo leal e espirituoso que serve como meu beta. Ele está sempre ao meu lado, pronto para oferecer conselhos ou contar uma piada. Eles são todos os irmãos que sempre quis, especialmente desde Talon. Balançando a cabeça, suspiro. Talon não é importante, digo a mim mesmo.
Enquanto caminhamos pela praça da cidade, as palavras de James pairam no ar como um eco provocador. "Ei, Dan," ele chama, interrompendo intencionalmente a tranquilidade do momento. Pauso por um momento, sabendo exatamente para onde essa conversa está indo. Minha mente corre com pensamentos conflitantes enquanto tento manter a compostura.
"Por que você deixou aquela garota de Shadowwood ir?" James cutuca, seus olhos brilhando de malícia.
Respiro fundo, lutando para encontrar as palavras certas para defender minha decisão. "O que você queria que eu fizesse? Matasse ela?" Minha voz está firme, mas meu coração bate forte no peito, o peso da minha escolha pesado na minha mente.
"Ela é de Shadowwood, Dan," James retruca com um encolher de ombros indiferente. "Eles são nossos inimigos."
Cerro os punhos, sentindo a onda de raiva subir dentro de mim. "Ela não é uma ameaça, James," respondo, tentando manter meu tom controlado. "Ela é só uma garota. Dezessete anos, ainda no ensino médio."
"Então?" James desafia, recusando-se a recuar. "Ela ainda é uma Shadowwood."
Me forço a continuar andando, resistindo à vontade de explodir de frustração. Discutir com James só vai gerar mais tensão, e não posso me dar ao luxo disso agora. Minha alcateia precisa de estabilidade, não de discórdia.
"Bem, como alfa, meu trabalho também é evitar guerras desnecessárias," explico, tentando manter minha calma. "Ela não representava nenhum perigo para nós ou nosso território. Ela estava apenas perdida e curiosa."
James dá uma risada desdenhosa e revira os olhos, claramente insatisfeito com minha resposta. "Perdida e curiosa? Mais como espionando e tramando."
Cerrei os dentes, sentindo o tumulto crescendo dentro de mim. Não quero justificar minhas ações para ele. Ele não entenderia o conflito que senti quando a vi na floresta. Ela estava apavorada, e meus instintos de protetor entraram em ação. Não podia deixar minha alcateia piorar as coisas para ela.
Enquanto continuamos andando, minha mente volta ao momento em que decidi deixá-la ir. Não consigo evitar me perguntar se a verei novamente, e o que farei se isso acontecer. A incerteza me corrói, mas sei que tomei a decisão certa para minha alcateia.
Mas James não sabe quando parar. Ele continua provocando, tentando me irritar ainda mais. Sinto um rosnado crescendo na minha garganta, um aviso para ele recuar. Ele não dá ouvidos.
Finalmente chego à churrasqueira, onde o cheiro de carne assada enche o ar, e a alcateia se reúne ao redor, esperando que eu os alimente. Meu papel como líder e provedor toma precedência sobre meus conflitos. Tento me concentrar na tarefa em mãos, virando a carne com um senso de propósito.
Ainda assim, mesmo enquanto tento me imergir nas responsabilidades de ser alfa, James murmura algo sob sua respiração. Meus ouvidos captam as palavras fracas, e minha paciência se esgota.
"Basta," eu estalo para ele, meus olhos se estreitando com um lampejo de intensidade. O resto da alcateia me olha, sentindo a tensão no ar.
Marcus e Orion, sempre leais, tomam seus lugares ao meu lado, oferecendo apoio silencioso. Eles confiam no meu julgamento como alfa, entendendo as complexidades das minhas decisões.
Mas James, ele é sempre o instigador, sempre procurando uma oportunidade para me provocar. Luto contra a vontade de deixar minhas emoções me dominarem e permaneço firme na minha resolução.
No fim, a unidade da alcateia é o que importa, e não vou deixar ninguém, nem mesmo James, colocar isso em risco.
Marcus entende que é sobre Elena, então ele apenas sorri, enquanto Orion dá um soco brincalhão em James e o resto da alcateia continua conversando. Eles sabem que é melhor não mexer comigo quando estou de mau humor. Especialmente quando se trata dela.
Verifico a carne novamente e vejo que está pronta. Começo a servir para os lobisomens mais jovens e os outros que estão com fome. Eles me agradecem e começam a comer, aproveitando a comida.
Sorrio e os observo comer. Amo minha alcateia. Amo cuidar deles, prover para eles, protegê-los.
Vejo os mais jovens brincando e rindo. Eles me lembram dela.
Ela.
A garota da alcateia Shadowwood.
Elena.
Já a vi brincando com os mais jovens também. Na escola e na cidade, ela sempre é gentil e carinhosa com eles. Ela os ama como se fossem dela.
Ela ama crianças.
Eu também.
Tenho dezenove anos, mas quero começar uma família em breve. Minha linhagem. Meu legado.
Talvez isso seja algo que temos em comum.
Mas não posso pensar nisso. Não posso pensar nela.
Ela é uma Shadowwood. Ela é uma inimiga.
Ela não é para mim.
Finjo que não a conheço quando a vejo na floresta. Quando verifico seu colar e vejo seu nome gravado nele.
Elena.
Deixei-a ir sem dizer uma palavra.
Mas não consigo esquecer seu rosto.
Seus olhos dourados.
Seu cabelo castanho.
Seu corpo esguio.
Sua expressão assustada e curiosa.
Ela me assombra.
Ela me tenta.
Ela me confunde.