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Carrasco, parte I

Oceano negro, gelado e escuro

Eu sou o tubarão faminto

rápido e impiedoso

Mas a única garota que podia falar com ele

Eu simplesmente não sabia nadar

me diga o que é pior do que isso

Os ecos nos corredores

Eles dançam pelas paredes

As memórias do seu fantasma

Você era quem eu costumava amar

e eu ainda amo

Mas você não era quem eu mais amava

Lydia – Highly Suspect

beatrice

Qual é o sentido de começar tudo isso, se não for para aliviar minha mente de todas as correntes que me prendiam? Para poder encontrar o perdão de Giacomo, para perdoar a mim mesma por ter acreditado que poderia ser verdadeiramente feliz.

Um verdadeiro jogo de xadrez se formou dentro da mente, pronto para agir a cada escolha e em cada curva possível.

Um jogo perigoso, já que o xadrez humano gera mortes.

Ouvir a música repetidamente em um loop enlouquecedor só me deixa mais acordada enquanto minha mente tenta se perder no significado das palavras. Talvez essa seja a diferença, eu aceitei o monstro que habita em mim como uma segunda camada, como o ar que respiro.

Com cada dor de cada mordida, com cada surra, pensamentos se formavam dentro de mim, ocupando um espaço que eu antes acreditava ser bom.

O espaço treinado desde o nascimento para ser condescendente, paciente, amoroso e obediente agora é apenas um espaço oco e escuro, os desejos suicidas que eu tinha foram tomados pelo desejo insano de consumir cada grito e cada gemido de dor.

Com fogo e sangue e a loucura intrínseca aos solitários de alma, minha mente agarrada a todas as ideias fluindo em um esquema perfeito, as peças de xadrez se movendo toda vez que eu levantava o bastão para bater no desgraçado de novo e de novo.

Resolvi tapar sua boca enquanto as palavras começavam a atingir as cicatrizes abertas dentro de sua alma, suas acusações de ser uma má esposa, de ser uma vadia de uma família ruim. A indignidade de carregar um herdeiro Sartori.

Uma brincadeira infame onde cada movimento traz um sorriso em meio ao caos de sangue espalhado pelo pequeno quarto que costumava ser minha cela.

Meu ouvido direito pedia descanso do som incessante e mesmo com a dor eu deixei a música penetrar, quando você perde a cabeça, você se sente livre ou vivo?!

Não era hora de segurar a dor, não quando meu demônio precisa cantar, quando minha mente precisa sentir o sangue esquentar. Eu observei seus olhos tremendo, sua respiração fora de compasso e o suor em sua testa instigando o pior em mim, algo que eu nunca imaginei ser possível como um sonho distante se tornando realidade, agora mesmo.

Levantei o machado, cortando seu tornozelo deixando apenas um toco no lugar, seus grunhidos reverberando pela sala com o isolamento se misturando à música. Deixei o machado na mesa ouvindo um breve suspiro de alívio, o que ele não sabe é que o inferno está aqui, foi ele quem me ensinou isso. Peguei um pano e fui até seu pequeno armário, encontrei o ácido que precisava, e voltei pressionando o pano com ácido no que restava de seu tornozelo.

Eu sou sua carrasca, sua dona, seu inferno.

Minha mente perturbada trouxe de volta as palavras infelizes, a memória é uma vadia nojenta.

Usei a mesma bola vermelha que fui forçada a usar, a visão trazendo um prazer tão distorcido. É isso que sou agora? Uma versão dele?

Uma carrasca como Stefano foi todos esses anos.

Levantei-me olhando para o trabalho como um todo, teria sido mais difícil sem a ajuda do meu irmão para segurá-lo nesta vara de açougueiro, convencê-lo foi complicado, mas valeu a pena, o gosto de retribuir todo o seu amor é só meu.

E essa vai ser minha memória mais agradável.

Cada 'eu te amo' sendo devolvido à sua maneira, usando o momento para vingar cada criança que ele estuprou na minha frente e cada criança que ele tirou de mim.

Peguei a vara de metal balançando de um pé para o outro sentindo a música comandar meus movimentos, quando o baixo atingiu o ápice, girei meus quadris e bati nele nas costelas ouvindo o som dos ossos quebrando, como uma melodia suave.

Balancei a cabeça observando qual seria o próximo ponto e de repente nada fazia mais sentido, nada fazia sentido, nada além de um pedaço de carne reduzido a nada. Apesar do prazer que se infiltrava, a sensação de finalmente saciar aquela pequena sede de sangue voraz, sendo consumida pelo desejo de vê-lo em pedaços, como todos os pedaços que ele fez de mim.

Com um cutelo comecei os cortes, seus olhos revirando de dor, os gemidos enchendo o espaço e a baba escorrendo pela bola vermelha, sangue espirrando por toda a sala, larguei o cutelo e peguei uma faca, acertando seu abdômen e abrindo-o de ponta a ponta, as vísceras caindo no chão, o prazer de matar se tornando parte da minha alma, seus olhos perdendo a vida.

Comecei por eles, aquela parte que um dia iludiu o pequeno mundo de fantasia me fazendo acreditar que eu poderia ser feliz dentro da máfia, enfiei a faca em cada um de seus olhos, coloquei cada um em uma pequena caixa, caminhei para o outro lado da sala puxando o tambor de metal posicionado só para isso, seus pés jogados pela sala foram arremessados como uma bola de basquete, peguei as vísceras jogando dentro do tambor.

Nem um pingo de compaixão ou pena pelo morto.

“Com o cutelo vai demorar muito,” soltei em voz alta para o cadáver à minha frente.

Levei a faca e o cutelo para a mesa pegando o machado, fazendo a preparação para o arremesso e lá vai uma coxa prestes a ser rasgada.

E nesse ritual de esventrar cada parte do corpo, expulsei cada memória dolorosa, cada hematoma, mesmo que tudo dê errado, esse pequeno momento sempre será minha vitória.

Peguei o galão de gasolina jogando no tambor, subi em um banquinho e desamarrei minhas mãos presas adicionando ao pequeno churrasco, sua cabeça sem olhos no fundo vindo em minha direção me arrancou uma risada. Afastei-me o suficiente para encostar meu corpo cansado na porta, pegando o maço de cigarros e o isqueiro dele.

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