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Ele não pode me ver.

"Você tem que viver um pouco," diz Roxana. Ela está sentada à minha esquerda. Seu assento é perto da janela.

Não consigo tirar os olhos dele.

Eu aceno com a cabeça, "Mmmh."

"Então você vai hoje à noite?" Sua voz está cheia de empolgação.

Ele passa a mão pelo cabelo. Seus olhos fixos no celular.

"Onde?" Não faço ideia do que ela está falando.

"Festa de volta às aulas, dã!"

"Não."

"É nosso último semestre no campus, você deveria se divertir. Caso contrário, você vai se formar ainda virgem."

Ele nem sequer desvia o olhar. Ele nunca olha para mim.

"Você ouviu o que eu acabei de dizer? E o que é que você está olhando?" Ela se move para conseguir um ângulo melhor.

Ela segue meu olhar.

"Quinn, um colírio para os olhos. Não comece a fantasiar, ele está fora do alcance de qualquer garota, exceto dela." Ela inclina a cabeça em direção à porta.

Courtney Emerson.

A única herdeira das indústrias Emerson.

Ela entra com graça, seu cabelo caindo livremente sobre os ombros. Seus passos são calculados e intencionais. Sua presença exige atenção. A classe inteira a observa, exceto Quinn, que nem se dá ao trabalho de levantar a cabeça.

Ela vai direto até ele.

Ele levanta a cabeça, entediado.

"Você não apareceu ontem à noite." Ela tenta sussurrar, mas todos ouvem.

A cabeça de Quinn gira na minha direção, nossos olhos se encontram.

"Vamos nos acomodar." Uma voz masculina anuncia.

Sou forçada a olhar duas vezes só para confirmar. Os olhos do Sr. Marcelo estão me encarando. Achei que não teria que enfrentá-lo neste semestre.

"Cara, certifique-se de me ver depois da aula," ele diz.

Todos se viram para me dar um olhar de pena.

A aula começa. Mantenho minha cabeça baixa, embora ocasionalmente sinta o olhar ardente do Sr. Marcelo através do meu crânio.

O período inteiro é um borrão e fico aliviada quando termina. Finjo estar arrumando minhas coisas enquanto a sala esvazia lentamente. Levanto a cabeça, esperando que o Sr. Marcelo tenha desistido e ido embora.

Ele ainda está me esperando.

Talvez eu tenha que enfrentá-lo agora do que mais tarde.

Caminho lentamente até ele. Estamos só nós dois na sala.

"Você não apareceu para nosso encontro para tomar café." Ele vai direto ao ponto.

O Sr. Marcelo é o professor mais jovem de todo o instituto. Ele tem uma postura angular, seu rosto de bebê o faz parecer mais jovem para sua idade e, seu sorriso com covinhas o torna muito atraente.

"Eu viajei para visitar minha família durante o recesso." Eu minto.

Ele levanta as sobrancelhas, como se não acreditasse em mim.

"Ok. Vamos remarcar para este sábado."

Respiro fundo e aceno com a cabeça.

"Ótimo. Vejo você então." Ele diz feliz.

Roxana está esperando na porta, obviamente, ela estava escutando. Ela me dá um olhar malicioso.

Passo por ela e ela me segue de perto.

"Eu te conheço há quase quatro anos, mas você é tão misteriosa quanto no primeiro dia em que te conheci." Ela diz atrás de mim.

Meu celular vibra. É um número privado e eu sei que é o Quinn. Abro a mensagem.

Consulta médica. Check-up trimestral. Esteja lá à tarde.

Coloco o celular de volta na bolsa.

"Eu tenho que ir. Te vejo mais tarde para nossa tradição de batatas fritas," eu digo.

Roxana revira os olhos.

"Onde você vai?"

Eu hesito tentando encontrar uma boa mentira.

Ela fala, "Viu, é disso que eu estou falando. Segredos e mentiras são o que você faz de melhor."

Dou uma risadinha enquanto a abraço. "Você pensa demais." É tudo o que consigo dizer antes de me despedir.

Corro pelo corredor até os banheiros, mando uma mensagem para meu irmão, Oliver. Depois de alguns minutos sem resposta, decido ligar para ele.

"Precisa de mim?" Ele me provoca.

"Te mandei uma mensagem há alguns minutos."

"Então agora você quer ser vista comigo?" Sei que ele está com um sorriso presunçoso ao dizer isso.

"Não. Só me encontre no nosso lugar."

Desligo a ligação antes que ele comece a falar sobre que tipo de família somos se não podemos ser vistos juntos no campus.

A caminhada até uma parte isolada do campus é lenta e agonizante. Tenho que olhar para trás ocasionalmente para ver se alguém está me seguindo.

O carro velho e surrado de Oliver está estacionado no final da estrada. Parece que está preso com arame e fita adesiva, funcionando à base de orações e tempo emprestado.

Fumaça escura sai do cano de escape. Nunca consigo entender seu amor por aquele carro velho e enferrujado.

"Eu não deveria estar fazendo isso," ele diz, quando entro no carro.

Demora um pouco para o motor ligar.

"Desculpe, mas estamos quase lá, Oliver. Teremos nossas vidas antigas de volta," eu digo.

Ele não responde, apenas liga o rádio e sintoniza em uma estação de rock and roll. Então aumenta o volume. Sei que é a maneira dele de me ignorar.

Viro-me para olhar pela janela enquanto ele dirige.

Ele desliga o motor a alguns prédios de distância da clínica do médico. Imediatamente vejo o jipe de Quinn.

Saio do carro. "Eu volto," eu digo.

"Não vou te esperar. Tenho certeza de que você encontrará outros meios e um cérebro para te fazer ver o que está prestes a fazer."

Ele não espera minha resposta nem reação. Apenas vai embora dirigindo.

Balanço a cabeça antes de começar a caminhar em direção ao meu destino. É uma caminhada curta e não me dá o luxo de pensar. Empurro as portas e entro.

Vejo Quinn sentado na área de espera. Ele está com uma expressão impaciente.

"Ela está esperando," ele diz, em um tom audível. Ele nunca me espera. Não que eu me importe, o sentimento é mútuo, por enquanto.

Ele se dirige a uma porta com o nome Dra. Anika. Nunca consigo me acostumar com visitas ao médico, não importa quantas vezes eu passe por isso.

Ela está sentada à sua mesa. Não levanta a cabeça quando entramos, apesar de Quinn bater a porta para chamar sua atenção.

Finalmente, ela fecha o livro que estava escrevendo. Ela se levanta. Tem a postura de um soldado. Cada ação que toma é precisa e intencional. Ela sorri de uma maneira fria e distante, como profissionais fazem. Nunca consigo relaxar com essas expressões.

Ela passa pelos arquivos procurando os nossos. É um procedimento de rotina que fazemos três a quatro vezes por ano.

Ela se senta e começa com as perguntas regulares. Temos outros parceiros com quem estamos sexualmente envolvidos além de nós? Ela pergunta quando foi meu último ciclo, blá blá.

Respondemos, ela coleta nossas amostras de sangue para testar qualquer IST e sorologia. Ela vai além e me testa para a presença do hormônio HCG.

Meu acordo de sexo casual com Quinn é que não temos outros parceiros sexuais. Claro, Quinn pode namorar. Ele tem uma reputação de playboy a manter, mas nunca leva suas conquistas para a cama. Fazemos check-ups regularmente. E a parte importante do nosso relacionamento é puramente sexual. Lá fora, no mundo real, não nos conhecemos. Somos completos estranhos.

"Estamos limpos." A doutora volta com os resultados.

Quinn se levanta pronto para ir. Ele mal nos reconhece enquanto sai.

Dou a ela um sorriso falso.

"Foi bom trabalhar com você. Segundo Quinn, este é seu último check-up. Cuide-se." A doutora diz.

Último check-up?

Encontro Quinn prestes a sair.

"Por que este é meu último check-up?" Estou me sentindo toda confusa. Porque sei o que isso significa. Ele quer acabar com nosso acordo.

"Sim, é." Ele não responde o que perguntei. Seu comportamento é o de uma pessoa entediada. E sua atitude é 'Eu sou Quinn, faço o que quero, não me importo.'

"Por quê?" Pergunto frustrada.

"Não acho que te devo qualquer explicação, nem você a mim. Vou te ligar quando precisar de você."

Assisto horrorizada enquanto ele entra no carro e vai embora dirigindo.

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