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2. Jantar e festa

[AVA]

"Sério, mãe? Pode parar, por favor?" Eu soltei um gemido, sentindo-me exasperada mais uma vez. No entanto, as tentativas incessantes dela de domar meu cabelo crespo e rebelde me fizeram afastar suas mãos e dar um passo para trás.

"Qual é o problema?" ela retrucou, tentando manter a voz baixa, mas claramente irritada. "Eu só estou tentando te ajudar. O que há de errado nisso?" Ela revirou os olhos e balançou a cabeça, como se tivesse atingido o limite da paciência com meu comportamento infantil. "Essa noite é uma grande oportunidade pra você. O que você fez com o dinheiro que te dei pra ir ao salão e se arrumar? Não me diga que gastou com livros ou outras coisas de estudo", ela bufou. "Eu não deixei bem claro o quanto essa festa é importante, Ava? Por que você não me escuta mais?"

Soltei um suspiro frustrado.

Em termos simples, minha mãe estava tentando me arranjar com um cara rico para que nossas vidas pudessem ficar um pouco menos miseráveis, pelo menos por um tempo. Embora eu tentasse entender o desespero dela, considerando nossas circunstâncias difíceis, isso não significava que eu podia aceitar que ela chegasse a esse ponto de praticamente vender a própria filha. Era um ato repugnante, independentemente da classe social.

Com outro suspiro pesado, passei a mão pelo cabelo, afastando os cachos selvagens do rosto. "Vou pegar uma bebida pra mim. Não tem como eu lidar com essa situação estando sóbria."

"Ava!" Minha mãe me repreendeu e agarrou meu pulso antes que eu pudesse chegar ao bar. "Você não pode perder essa oportunidade."

"Eu só quero uma bebida, caramba. Relaxa!" Eu não queria ser grossa, mas ela estava realmente testando minha paciência ao limite naquela noite.

Nos últimos trinta minutos, ela vinha tentando incessantemente me apresentar à suposta elite da cidade. Todos acabavam sendo iguais: babacas arrogantes que não suportavam um mínimo de imperfeição.

Mas esse não era o problema. Eu não me importava de conhecer pessoas novas; na verdade, eu era bem boa em socializar. O problema estava no julgamento esmagador nos olhos deles. Talvez minha mãe não percebesse, mas nossa família tinha perdido respeito e credibilidade na sociedade desde que fomos à falência há um ano e meio. Não perdemos apenas nosso negócio, bens e riqueza; perdemos também amigos, parentes e pessoas que nos desejavam o bem. Era demais para ela suportar. Por isso eu dizia que entendia o desespero dela, e realmente entendia. Se ao menos ela não estivesse tentando me usar como um peão para seus próprios fins.

Fui até o balcão, me esgueirando entre os convidados que conversavam. Pedi uma taça de vinho tinto enquanto observava o amplo salão em busca de rostos familiares.

Os Johnsons estavam organizando o jantar para comemorar o aniversário de dezesseis anos da filha. O local da festa era imenso e sofisticado, como se esperaria de uma família do porte deles, com decorações impecáveis. Flores, balões e confetes caíam do teto como flocos de neve.

Se nossas circunstâncias não fossem tão desesperadoras, esse tipo de evento teria me atraído. Mas agora, tudo parecia falso e desnecessário, enquanto a dura realidade me perseguia como um fantasma implacável.

"Engraçado te ver aqui, Monroe", alguém zombou. "De princesa a pobretona. Como a vida tá te tratando ultimamente?" Ela sorriu, e eu lutei contra a vontade de vomitar ali mesmo.

Antes de me virar para encarar a ultimate bitch, Coraline Edwards, revirei os olhos e amaldiçoei minha péssima sorte em silêncio. Nós costumávamos ser amigas, mas depois da morte de Valerie e do colapso financeiro da minha família, nosso trio de amigas, que antes era adorável, se desfez.

A hostilidade de Coraline contra mim continuava sendo um mistério que eu queria desvendar, mas não encontrava o momento certo. Havia coisas demais acontecendo, mudanças significativas em todos os aspectos da minha vida. Era difícil focar em qualquer outra coisa. E, depois de muito pensar, convenci-me de que não valia a pena no fim das contas.

"Tem sido uma experiência reveladora", respondi, esboçando um pequeno e gentil sorriso meu. "Aprendi bastante."

"Ah, é mesmo?" Coraline debochou.

"É. Por exemplo, um amigo de verdade é aquele que fica ao seu lado na hora da necessidade. E aqueles que fogem ao primeiro sinal de problema? Esses são seus piores inimigos. O que acha disso?"

Coraline abandonou o sorriso — a fachada — e me lançou um olhar furioso. "Você acha que é muito melhor que os outros, não é, Monroe?"

"Nunca disse isso, mas vou tomar como um elogio", retruquei, tentando soar genuinamente grata, só pra irritá-la ainda mais.

Ela se eriçou, suas sobrancelhas finas franzindo. "Fingir que é descolada só vai te levar até certo ponto. Cuidado, Monroe. As pessoas nem sempre vão ser gentis com você."

"Nossa, tô impressionada com o quanto você ainda se preocupa comigo", fiz biquinho, colocando a mão sobre o coração. "Mas, sério, eu sei me cuidar. Pode ficar tranquila."

O olhar dela se intensificou, e ela passou por mim como um furacão, sem dizer mais uma palavra. Mas não antes de esbarrar de propósito no meu ombro e “acidentalmente” derramar o vinho dela em mim.

— Ops! Desculpa — disse ela, desaparecendo na multidão com uma piscadela travessa.

Finalmente, me permiti franzir a testa. Peguei alguns guardanapos de papel no balcão e tentei limpar a bagunça que ela havia feito. — Desgraçada!

— Como é?

Meu corpo congelou, e meu coração deu um salto ao ouvir aquela voz grave.

Não. Minha sorte não podia ser tão ruim assim. Será que ele estava mesmo aqui?

Fazia mais de uma semana desde aquela noite inesquecível. Eu não conseguia parar de revivê-la na minha mente. A sensação das mãos fortes dele no meu corpo, o calor e o sabor delicioso dos lábios dele nos meus, a forma como ele me preenchia completamente e até mais.

Droga.

Eu precisava me controlar. Ele não fazia ideia de que a acompanhante que ele contratou naquela noite era eu. Não havia motivo para ele saber. Primeiro, porque a agência para a qual eu trabalhava tinha uma reputação de discrição, e segundo, por que ele suspeitaria de algo? Foi só um acordo de uma noite. Nós dois conseguimos o que queríamos. Ele teve minha companhia, e eu recebi o pagamento. Uma transação de benefício mútuo.

Então, por que eu sentia uma pontada de tristeza por ele não ter entrado em contato novamente? Será que eu não fui boa o suficiente? Será que ele procurou outra acompanhante porque eu não consegui satisfazê-lo? Normalmente, os clientes voltam pedindo mais. Por que ele não voltou?

Não. Eu não deveria pensar nisso. Por que estou sequer considerando essas coisas?

Respirei fundo, endireitei os ombros e convoquei meu sorriso bem treinado. Só precisava levantar o olhar, e lá estava ele. Impondo-se sobre mim com sua altura impressionante e músculos definidos.

Brian Reinhold era uma visão tão deslumbrante que doía nos olhos. O cabelo escuro e espesso parecia ainda mais sedoso do que eu lembrava ao tocar naquela noite. Seus olhos cinzentos penetrantes pareciam contemplar os mistérios dos oceanos e do universo com uma curiosidade serena. Usando um terno de três peças sob medida ou não, ele exalava um charme inegável. Era difícil acreditar que alguém da idade dele pudesse ser tão atraente. Claro, ele era pelo menos cinco anos mais novo que meu pai, mas o fato de ele ter tido uma filha da minha idade não fazia muita diferença de uma perspectiva puramente física.

Mas eu realmente precisava parar de me deixar levar por esses pensamentos inadequados sobre ele. Era errado. Muito, muito errado. Valerie ficaria furiosa se soubesse. Por outro lado, talvez as coisas teriam sido diferentes se ela ainda estivesse aqui. Quem poderia dizer?

— Você é a filha do Dean, não é? — disse ele, inclinando a cabeça ligeiramente para a direita, segurando uma taça de vinho branco.

— Você se lembra de mim? — perguntei, percebendo o quão tola era essa pergunta. Valerie e eu praticamente crescemos como irmãs. Apesar de ser o presidente de uma corporação multibilionária, ele sempre arranjava tempo para nossos encontros e atividades. Ele até estava lá no dia do acidente. Foi logo depois que ele deixou Valerie no ponto de ônibus para o nosso acampamento de verão...

— Claro, você cresceu bastante agora — disse ele com naturalidade, a voz carregando um tom de aspereza e um peso emocional que eu não pude deixar de notar. Havia um desejo, um vazio que ninguém poderia preencher exceto Valerie. Ele provavelmente estava pensando o quanto ela teria crescido se não tivesse insistido em participar daquele evento do acampamento. Ele provavelmente odiava a palavra “acampamento” agora. E eu não podia culpá-lo. Eu também odiava.

Um rubor subiu pelas minhas bochechas, traindo meu constrangimento, enquanto eu tentava domar um cacho rebelde que caía sobre meu rosto. — Obrigada, Sr. Reinhold — murmurei, tímida.

Por um breve momento, algo pareceu brilhar nos olhos dele antes de desaparecer. Provavelmente era só minha imaginação.

— Claro, bom te ver. Onde está seu pai? Não consigo encontrá-lo — perguntou ele.

— Ele não estava... se sentindo muito bem — respondi, sabendo muito bem que meu pai estava furioso por minha mãe ter aceitado o convite. Mesmo depois de perdermos tudo o que tínhamos, o orgulho dele continuava inabalável.

— Ah! — respondeu ele, o tom se tornando mais sério enquanto enfiava a mão livre no bolso. — Bem, tudo bem então. Até mais. Aproveite.

E, assim, ele se foi, misturando-se a outros homens e mulheres da idade dele, rindo e participando de conversas animadas. Enquanto ele parecia estar se divertindo bastante, eu ainda estava atordoada com nossa breve interação. Quase alheia ao mundo ao meu redor, quase não percebi a vibração do meu celular no bolso, sinalizando uma mensagem chegando.

Tirei o celular do bolso e encarei a tela com puro horror.

Eu tinha esquecido completamente do trabalho que prometi fazer hoje à noite.

Droga. Eu estava atrasada.

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