




2. O começo
Serena
Serena suspirou, lembrando-se da morte de seu pai. Foi um dia horrível e um que ela nunca esquecerá. Aquele foi o dia em que ela perdeu a pessoa que mais amava e o dia em que seu destino começou a ser decidido por outra pessoa.
A luz que brilhava através das janelas lembrava-a de que o tempo não esperava por ninguém. Era hora de ir. Serena fechou o álbum e o envolveu em um pano marrom gasto, depois o colocou de volta em seu esconderijo sob o piso de madeira.
Antes de recolocar a tábua para cobrir a abertura, ela deu uma última olhada no álbum, imaginando o símbolo na capa do livro. Ouro delineava sua forma e parecia uma maçã devido à sua redondeza. Havia três pequenos espirais no centro, formando um triângulo. Quanto mais você olhava, mais hipnotizado ficava. Mesmo que o design parecesse tão simples com apenas uma cor, os detalhes colocados nele o tornavam extraordinário e digno de ser lembrado.
Usando a imaginação, os espirais poderiam ser bagas e as folhas anexadas a elas que desaparecem na luz faziam com que tudo parecesse um visco. Sua mãe sempre teve uma coisa com o Natal.
Bem, não mais.
"Serena, onde diabos você está?! Meu cadarço precisa ser amarrado!"
"Shelena, onde está minha bolsa?!"
Alarmada, Serena rapidamente selou o piso e o cobriu com um tapete velho e amarelo. Ela tossiu quando a poeira voou em seu rosto e deixou uma nota mental de que precisava fazer uma limpeza de primavera em breve. Agora, Serena pensou consigo mesma, hora de lidar com esses pirralhos...
"Já vou!" Serena gritou enquanto trancava a porta do sótão, colocando a chave no bolso. Ela então desceu as escadas correndo. Se ao menos sua camiseta azul fosse seus lençóis agora. Em vez disso, ela tem que lidar com ISSO de manhã.
Ela correu até chegar ao quarto de sua meia-irmã, Gena, no segundo andar. A porta estava aberta e a garota estava ocupada franzindo a testa e batendo o pé enquanto estava sentada na cama, e de forma alguma suas ações eram fofas. Serena respirou fundo e bateu na porta para chamar sua atenção.
"Onde você estava?" Gena perguntou, ainda franzindo a testa. "Estou te chamando há tipo--" ela começa a contar nos dedos. "--três minutos!"
"Acho que você quis dizer três segundos," Serena respondeu, os lábios se contraindo para esconder um sorriso.
"Tanto faz." Gena olhou para as unhas. Quando percebeu que Serena ainda estava parada ali sem fazer nada, deu-lhe um olhar incisivo e apontou para os sapatos.
"Ah, sim, claro." Era divertido fingir ser boba. O fato de que isso irritava suas meias-irmãs sem que ela fosse punida por isso era um bônus. Ela se aproximou de Gena, ajoelhando-se enquanto começava a amarrar os cadarços.
Provocar seus parentes por afinidade era a única diversão que ela tinha ao viver naquela casa sem amor. Além disso, ela sentia que eles mereciam. Gena não era tão burra a ponto de não saber amarrar um nó simples, ela estava apenas aproveitando qualquer oportunidade que surgisse para provocar Serena e tratá-la como uma criada. Pelo menos, era assim que parecia. Observando-a através dos cílios, Serena viu que Gena ainda estava brincando com as unhas. Serena nunca entenderia essas duas.
Logo ela terminou, levantou-se e estava pronta para sair.
"Ah, e eu preciso que você faça meu dever de casa hoje," Gena declarou. Ela pegou um livro na bolsa. Serena não o pegou, mas leu a capa. "Eu posso ou não ter esquecido de te dar isso ontem à noite."
'MATEMÁTICA. também conhecida como Loucura Atacando a Cabeça Lentamente.'
Serena sorriu e olhou para Gena, que ainda segurava o livro, esperando que ela o pegasse.
"Desculpe, Gena. Sua empregada pessoal está fora de casa e estará com você em um instante. Por favor, aguarde enquanto ela te serve com uma dose extra de, bem, bom senso para sua alma insaciável."
"Como é que é?!" Gena gritou. A morena deu de ombros. "Eu não vou fazer isso." E saiu do quarto.
Aquela pirralha provavelmente vai querer a cabeça dela mais tarde. Agora, para o outro bebê.
"Shelena, Sabrina ou seja lá qual for seu nome, venha achar minha bolsa!"
Mary. Alta e burra, bem, burra quando se trata de lembrar algo tão simples como o nome de Serena. É tão difícil pronunciar duas sílabas?
A voz dela ecoou da sala de estar. Serena desceu as escadas para encontrá-la, observando cada degrau. Quando chegou, viu sua segunda meia-irmã correndo de um lado para o outro, com o cabelo curto e tingido de loiro todo bagunçado. Ela se encostou na parede, esperando que Mary a reconhecesse, e visivelmente se encolheu quando Mary jogou as almofadas para fora do sofá. Aquela bruxa definitivamente faria Serena limpar essa bagunça, já que as mãos de Mary, que criaram esse desastre em primeiro lugar, magicamente desapareceriam depois.
Logo, Mary bateu a perna na lateral da mesa de centro e caiu de traseiro no chão.
Serena não conseguiu mais se segurar e inclinou a cabeça para trás, começando a rir.
"O que diabos é tão engraçado?!" Mary perguntou exigente.
Serena deixou escapar mais algumas risadinhas e depois pigarreou.
"Nada, Madame Mary, nada mesmo." Ela fez uma reverência. Isso mesmo, todas as damas da casa gostavam de ser tratadas como realeza. Sua madrasta gosta de pensar que é a rainha da casa, o que automaticamente faz dessas duas princesas, certo?
Nos sonhos mais selvagens delas, talvez.
"Ah, tanto faz, só encontre minha maldita bolsa!"
Serena não tentou esconder o prazer em seu rosto com o desconforto de Mary. Ela caminhou até o sofá e levantou uma bolsa roxa com um papel de cupcake grudado no fundo.
"Bem," disse Mary, levantando-se e limpando a poeira da calça. "Como isso foi parar aí?!"
"Acho que está aqui desde ontem à noite," disse Serena.
"Não estava! Você escondeu aí!" Mary arrancou a bolsa da mão de Serena e lançou-lhe um olhar que dizia 'tudo é sua culpa'.
"Por que eu esconderia sua bolsa onde todo mundo pode ver?!"
Mary balançou a cabeça. "Como eu vou saber? Você é a 'gênia do mal' ou algo assim! Tanto faz, você fez de propósito."
Serena revirou os olhos. Nunca em todos os seus dezesseis anos ela tinha visto uma garota tão...
'Nem tenho uma palavra para isso,' pensou consigo mesma.
Foi sorte para ela que Jenifer não estava em casa no momento, assim ela poderia se preparar para a escola e cumprir todos os desejos de suas meias-irmãs (quase todos) sem o incômodo de lidar com o dragão.
Serena estava descendo do sótão quando olhou para o velho relógio de seu avô, a única coisa que sua nova família a deixou ter além das roupas usadas. Pelos nuggets, já eram oito horas!
'Droga, vou me atrasar.'
Ela correu e saiu de casa justo quando Mary e Gena estavam prestes a chamá-la e dizer para ela levá-las. Da última vez que Serena teve que fazer o papel de motorista, as garotas arrastaram um cara relutante para dentro do carro. Ela teve que passar aqueles dez minutos ouvindo-as mimando-o com perguntas sobre quem ele mais gostava e o garoto nem teve chance de falar antes que elas começassem a falar de novo.
Depois que ele foi deixado, praticamente correu para fora do carro e se afastou o máximo possível. Por algum motivo, ela sentiu que precisava chamá-lo:
"Ei, desculpa por isso. Só para você saber, eu sou apenas a motorista."
Ele chegou à varanda antes de se virar para olhá-la. Algo completamente inesperado aconteceu, ele sorriu. O curto tempo que ele passou com elas fez Serena pensar que ele só era capaz de risadas nervosas.
"Bem, não foi tão ruim assim, pelo menos para mim," ele respondeu.
Ele piscou para ela e então entrou. Mesmo com a distância entre eles, todos ouviram quando ele trancou a porta.
A situação como um todo a fez rir, ignorando as irmãs no banco de trás, e ligou o motor. Olhando para o espelho retrovisor, viu as duas lhe lançando um olhar feio. Serena colocou um sorriso no rosto e voltou a dirigir.
Serena revirou os olhos ao lembrar. Nem é preciso dizer que ela nunca mais viu Gena e Mary com aquele garoto, e naquela mesma noite as garotas inventaram uma história ridícula para fazer Jenifer puni-la. Elas provavelmente estavam bravas com a forma como ele reagiu mal a elas ou por algum outro motivo, quem sabe?
Não demorou muito para que o prédio da escola aparecesse à vista, junto com a promessa de uma cadeira para descansar suas pernas cansadas e de um dia melhor por vir.
'Não vai demorar muito agora, só mais um pouco...'