




O fim da inocência...
Você é tão perfeito; seus olhos tão azuis, sua boca tão desenhada, seu cabelo tão esvoaçante. Não é só a sua beleza, mas a sua simpatia que faz todas as garotas caírem aos seus pés. Ah, Sorte, eu queria pelo menos um beijo seu, e então talvez eu ficasse satisfeita!
Pouco a pouco, meu mundo começou a girar novamente naquela adorável noite de formatura.
Olhei meu reflexo no espelho. O vestido preto que eu estava usando não era bem a minha cara, a Vivian tinha escolhido. Bem, dava para perceber, um vestido assim não parecia nada com algo que eu escolheria para a nossa festa de formatura. Era justo no corpo, com um decote em formato de coração e renda nas bordas, cruzado nas costas. Eu usava, para combinar, um sapato alto com tiras finas e pequenos cristais no salto. Meu cabelo era curto e preto, estilo chanel, e eu usava apenas uma presilha na frente. Meu rosto era normalmente pálido, com algumas sardas. Belisquei levemente minhas bochechas para fazê-las corar, não queria passar maquiagem, aquele vestido já era demais...
- Uau! Garota, você está um arraso!
Vivian irrompeu no quarto seguida por Alice. Ela estava usando um vestido vermelho muito elegante, com transparência e uma fenda que ia da coxa direita até o tornozelo. Seu cabelo loiro ia até a cintura, mas para a ocasião, estava preso em um coque com algumas mechas soltas.
Corei involuntariamente com o comentário. Eu não costumava me vestir assim, eu era a garota simples, a de regata, jeans e Converse. Vivian e Alice eram as verdadeiras uau!
- Uau, olha você! Está linda, Nicole! - Alice, que também estava deslumbrante, comentou, enquanto se sentava em um sofá no canto do meu quarto.
Eu não era esnobe; mas, caramba, elas estavam certas, o vestido se ajustava lindamente ao meu corpo esguio! Eu sempre tinha dificuldade em encontrar algo que me servisse, porque eu usava tamanho pequeno. Mesmo aos dezenove anos, meu corpo ainda não era muito curvilíneo e atraente; poucos seios, pouco bumbum. Vivian, ao contrário, tinha um corpo escultural, com belos seios siliconados. Alice tinha coxas grandes e seios proporcionais ao corpo. Não que eu fosse feia, mas com aquele grande "nada" que eu carregava, como eu iria atrair a atenção do Sorte?
Eu o conheci uma noite, três anos atrás, quando junto com Vivian e Alice, conseguimos escapar do colégio interno. Ele estava dando uma festa, e só a Vivian tinha sido convidada, mas como éramos praticamente uma só, fomos juntas. Estávamos loucas para ver o mundo fora da escola, animadas e curiosas, e foi paixão à primeira vista. Mas ele nunca olhou para mim. Lembro até hoje quando descobri sobre a atração dele por Vivian. Cara, aquilo doeu. Perceber que ele nunca me notaria porque eu não era boa o suficiente para ele. Mas eu sei que um dia ele vai me ver.
Meus pensamentos foram interrompidos pela voz irritante da Vivian cantando Oops, I did it again junto com a Britney Spears. Ela estava passando gloss no espelho enquanto cantarolava o toque do celular dela.
Yeah yeah yeah yeah yeah yeah
Yeah yeah yeah yeah yeah yeah yeah
I think I did it again
I made you believe we're more than just friends
Oh baby
It might seem like a crush
But it doesn't mean that I'm serious
'Cause to lose all my senses
That is just so typically me
Oh baby, baby (...)
-
Aiii! Poxa, por favor, Vivian. Só atende o telefone! - Alice arrancou o telefone da mão da Vivian, desbloqueou a tela, olhou por um momento e colocou no ouvido, seguindo o monólogo. - Ah, sim... Estamos prontas agora... OK... Estamos descendo.
-
Meninas, o Matthew está esperando a gente lá embaixo, vamos?
Matthew era o único homem em quem minha mãe confiava ao meu redor. Ele era motorista particular da empresa de segurança do pai da Vivian, e sempre nos levava e trazia. Ele era bonito, tinha uns quarenta anos, e também prestava serviços para o meu pai antes dele falecer.
Descemos e entramos no grande SUV preto. A conversa fluía livremente, eu não me lembrava de estar tão animada há muito tempo. Tudo isso era tão novo para mim, era uma nova oportunidade. Finalmente o ensino médio tinha acabado, e também os cursos preparatórios. Agora, quem sabe, eu poderia viajar pelo mundo, conhecer novas culturas, escolher uma faculdade? Respirei fundo ao lembrar que eu não teria essa liberdade. Quem eu estava enganando? Eu sabia muito bem que teria que assumir os negócios da família, suceder minha mãe na empresa. Não era o que eu queria, era a escolha dela, mas que alternativa eu tinha? Diferente dos pais da Vivian e da Alice. Elas tinham escolha, os pais delas eram mais liberais. No entanto, a mãe delas não tinha aparecido na Forbes como uma das mulheres mais poderosas do estado de NY.
Minha mãe era poderosa, dona de uma rede de joalherias mundialmente renomada. Seus pais, meus avós, não só começaram como também expandiram a empresa com muito esforço. Dizem também que meus bisavós eram garimpeiros e tinham o grande sonho de crescer e se tornar um império de fabricação de joias. E assim, de uma simples ideia, surgiu uma empresa multimilionária, passada de geração em geração. Quando minha mãe atingiu a maioridade, ela assumiu a empresa dos meus avós, triplicando os lucros com a ajuda do meu pai, na época um empresário na área de administração.
Eu, nesses 19 anos, não consegui construir um bom relacionamento com minha mãe, pois ela viajava frequentemente a negócios. Até os meus 8 anos, lembro que meus pais me levavam junto, mas quando meu pai adoeceu, ela acabou nos estabelecendo em New Braunfels, uma pequena cidade na divisa do Texas, por razões médicas. Seis meses depois, ele faleceu. Minha mãe achou que eu era grande demais para ter uma babá, então me matriculou em um internato para meninas ao norte da cidade.
Foi lá que conheci Vivian e Alice. Elas tornaram meus dias melhores e mais felizes. Aquela época foi difícil, eu estava constantemente sozinha, sentia falta do meu pai; ele era tudo o que minha mãe não tinha sido: amoroso, atencioso, carinhoso, um bom pai, mesmo que nem sempre estivesse presente. Eu só queria voltar para casa, sentia falta até da minha mãe, mesmo que não tivéssemos muita conexão. Eu chorava até dormir constantemente. Mas, como eu disse, meus dias eram melhores graças às minhas amigas. A vida melhorou um pouco quando passamos para o ensino médio. Hoje eu esperava que melhorasse um pouco mais.
-
Uau! - Tossindo. - O que --- tosse --- tem aqui? - Tossindo.
-
Alice engasgou depois de beber da pequena cantina de alumínio que Vivian tinha bebido e passado para ela.
-
Uísque. - Ela sorriu enquanto pegava a bebida da mão dela e tomava um gole. - Ah, qual é, Nicole? Não me olhe assim, estamos indo para a faculdade, querida. Que tal enlouquecer um pouco? Ninguém vai contar para a sua mamãe! - Ela deu uma piscadela generosa para Matthew, que olhava pelo retrovisor. - Ah, vamos lá! Só um gole! Até a Alice bebeu.
-
Depois de quase morrer engasgada! - ela retrucou, forçando uma carranca.
-
Eu não sei...
Eu olhei para Matthew, que parecia distraído com o trânsito.
- Ah, sabe de uma coisa? - Vivian se inclinou no banco da frente, surpreendendo Matthew, que a observava calmamente. Ela pegou o controle remoto e ligou o estéreo no último volume, espalhando a música Complicated, da Avril Lavigne, por todo o carro. - E aí? - ela levantou uma sobrancelha, como se desafiasse.
Bem, eu poderia ter dito não, elas não teriam me pressionado. Eu poderia simplesmente ter dito não, mas eu estava cansada das regras que, mesmo de longe, Madeleine me impunha. Não saia sozinha! Não beba! Não fume! Fique longe dos homens, eles só querem uma coisa! Preserve seu futuro, você será uma grande CEO quando me substituir! Eu já planejei tudo, Nicole... Nicole... Nicole. Eu quase podia ouvir a voz dela.
Como posso ouvir alguém que não me criou? Que não fez parte da minha vida? Que me abandonou quando eu mais precisava dela? Todos aqueles anos sozinha. Quando ela ou sua assistente enviavam simples presentes em datas comemorativas. Quantos aniversários, Natais, Ações de Graças, formaturas eu passei sozinha. E eu nunca, nunca fiz nada além do que ela me mandava. Hoje eu queria que fosse diferente. Repeti internamente, como um mantra "Hoje será diferente".
Alice soltou um leve soluço, olhando para mim com olhos marejados, enquanto segurava a garrafa após seu segundo gole.
-
Está tudo bem, querida - ela disse, batendo levemente no meu joelho. - Você tem que se sentir bem, não pressionada. - Ela sorriu docemente.
-
Eu sei. - Eu disse em um sussurro, mais para mim mesma do que para elas. - Mas acho que quero. --- Eu disse incerta. --- Sim, eu quero! - Concluí, afinal, o que poderia ser tão ruim?
Então eu peguei a garrafa e bebi. O líquido quente desceu pela minha garganta, queimando, e eu tossi algumas vezes e encarei os olhos curiosos acima de mim. Foi então que cantei o último refrão da música. Primeiro sozinha, depois, acompanhada por elas.
Why do you have to go and make things so complicated? (Yeah, yeah) I see the way you're
Acting like you're somebody else, gets me frustrated
And life's like this you,
You fall and you crawl and you break and you take what you get and you turn it into Honesty, you promised me I'm never gonna find you fake it
No, no, no
Cantamos em sincronia, gesticulando com as mãos, sentindo nossos espíritos e emoções se elevarem. Então rimos, relembramos os velhos tempos, fizemos planos para o futuro, cientes de que, a partir de então, tudo seria diferente.