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Como tudo começou

"Eu não entendo você", reclamo mais uma vez. "De quem foi a ideia? Trocar carne por peixe e achar que eu ficaria satisfeita?" Falo um pouco mais alto.

"Desculpe, senhora, sentimos muito pelo inconveniente. Gostaria de trocar o produto?" O homem pergunta.

"Claro que quero, e preciso disso o mais rápido possível". Respondo com um suspiro.

Desligo rapidamente o celular e o coloco no balcão. Respiro fundo, tentando manter a calma. Olho para o relógio com uma carranca, afinal, nesse momento ele parecia ser um vilão cruel. Termino os doces rapidamente e os coloco na geladeira, mas não descanso. Começo a preparar alguns petiscos, enquanto minha cozinheira faz o jantar. Hoje era um dia especial e passei muito tempo planejando cada detalhe, nada poderia dar errado.

Assim que terminei, coloquei tudo no forno e saí da cozinha, subindo para o meu quarto. Na cama já estavam minhas roupas separadas, eu tinha deixado tudo preparado para não haver atraso. Tomo um banho para tirar o cheiro de comida do corpo e saio com um sorriso. Me arrumo rapidamente e me visto elegantemente. Dou um sorriso para mim mesma ao me olhar no espelho e suspiro um pouco cansada, mas a empolgação estava tomando conta. Desço as escadas apressada e fico perto da porta da sala.

Apoio-me em uma mesinha ali e espero ansiosamente. As luzes estavam todas apagadas, afinal, isso deveria ser uma surpresa. Eu tinha mentido para meu marido dizendo que passaria a noite na casa da minha mãe. Joy, meu marido, finalmente tinha conseguido a promoção que tanto esperava e isso merecia uma grande celebração. Vejo a luz do carro dele e meu sorriso se alarga ainda mais. Ele demora um pouco para entrar, mas logo ouço vozes perto da porta. A voz não era só dele, havia uma voz feminina.

A porta se abre e ele entra, junto com a mulher. Apesar da escuridão, não precisei de muita luz para perceber que eles estavam se beijando. Eles se beijavam com intensidade, de uma forma que ele não fazia comigo há muito tempo. Isso apertou meu peito e o ar praticamente escapou dos meus pulmões. Fiquei paralisada, assistindo a essa cena como se fosse um pesadelo e que logo tudo desapareceria. Mas não desapareceu, e estava longe de ser apenas um pesadelo. Ambos parecem perceber que estão sendo observados e olham na minha direção. Seus olhos se arregalam, olhando para mim como se eu fosse um fantasma.

"Laura?"

A voz dele soa desesperada, assim como todo o resto.

"Eu posso explicar, amor". Ele fala enquanto se aproxima de mim e coloca as mãos nos meus braços.

"Pode?" Minha pergunta soa totalmente irônica.

Minha voz estava baixa e eu não conseguia demonstrar nenhum sentimento. Para falar a verdade, nunca me senti tão vazia. Não havia nada para mostrar.

"Foi um erro, apenas algo sem importância". Ele explica desesperadamente.

A luz já havia sido acesa, provavelmente por alguém que fazia parte do pequeno grupo de pessoas nos observando. Meus dois cunhados, meus sogros, minha sobrinha, dois amigos de trabalho do Joy e meus empregados, essas eram as pessoas que nos assistiam atentamente.

"Vá embora, Joy". Ouço a voz de um dos meus cunhados, Roberto.

"Não importa, isso não tem nada a ver com você". Joy responde, olhando para ele com raiva. "Vamos conversar lá em cima, Laura". Ele diz suspirando e pega minha mão, tentando me levar.

Eu fico no mesmo lugar, o que faz com que ele me olhe confuso e em desespero.

"Quero que você vá embora". Falo suavemente, mas com seriedade.

"Precisamos conversar, deixe-me esclarecer isso". Ele implora novamente, parado na minha frente.

"Vá embora!" Grito desta vez, o que causa um enorme silêncio na sala por um tempo.

"Estamos juntos há 10 anos, amor, não podemos jogar esse tempo fora". Ele fala como se sentisse dor, e logo algumas lágrimas saem de seus olhos.

"Você deveria ter pensado nisso antes". Falo friamente.

Seu olhar é de total surpresa, como se ele não pudesse acreditar no que estava vendo e ouvindo. Viro as costas para ele e começo a subir as escadas, sem nem olhar para a plateia que estava ali. Entro no meu quarto e tranco a porta. Encosto minhas costas na porta e encaro a grande foto na parede. A foto da nossa renovação de votos, que havia acontecido há menos de um mês. Eu estava vestida de noiva, um sonho que só pude realizar depois de muitos anos, e parecíamos estar apaixonados. Estávamos nos olhando e, por mais absurdo que pareça agora, o olhar dele transmitia amor.

Quando exatamente ele parou de me amar? Quando ele pisou em todos os nossos planos e em todo o tempo que passamos juntos? Meu peito começou a doer, muito. A dor era infinitamente grande e fiquei surpresa por parecer aumentar a cada segundo. As lágrimas que antes negavam existência começaram a cair rapidamente. Meu corpo estava lentamente perdendo a força até que eu estava no chão, enquanto encarava aquela maldita foto. Aquela maldita prova de que tudo o que eu tinha acabou e me fazendo questionar se o que vivi foi, de fato, verdadeiro.

Essa dúvida, as várias perguntas que se multiplicavam, a confirmação e toda aquela vergonha, me deixaram sem fôlego. Cada vez que eu respirava, parecia que lâminas afiadas estavam entrando nas minhas entranhas, destruindo tudo à vista. O fim estava sendo assustador.

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