




Como ele se atreve
==Matteo==
Bati as palmas na mesa, a fúria me cegando. "Como ele ousa?" rosnei. "O que lhe deu a audácia?"
Meu servo permaneceu impassível. Bem, não era como se eu esperasse que ele reagisse.
Droga! O pequeno bastardo que se chamava Lyons achava que podia me deixar de lado. Que inferno ele pensava. Desde o meu encontro com minha proposta... sujeita, eu não tinha tido descanso. Pensamentos sobre ela atormentavam minha mente. Eu tinha visões sempre que dormia, e aquele cheiro estava preso no meu nariz. Cansado, pedi aos meus servos que a vigiassem. Eu não queria reivindicá-la ainda. Agora, tudo estava indo bem, até que fui informado que Lyons... Lyons maldito Jones apareceu no apartamento dela. Sua conversa com ela foi interceptada e foi quando descobri que ele também tinha vindo para reivindicá-la. Você pode imaginar isso?
Eu não sabia o que me irritava mais. Lyons ou aquele homem patético chamado Haynes. Nunca vi alguém tão ganancioso quanto ele. Duzentos e cinquenta mil dólares poderiam mudar a vida de uma pessoa automaticamente. Num piscar de olhos. Mas não, não para Haynes. Ele queria morder mais do que podia mastigar. E o mais idiota era que ele continuava com sua garantia estúpida. Eu não conseguia entender por que um homem faria isso com sua filha. Bem, era um mundo louco. Eu tinha que me lembrar disso. Era realmente um mundo louco.
"Lyons," respirei furiosamente. Meu rosto se contorceu.
Não havia como deixá-lo reivindicar o que não era dele. De jeito nenhum.
E então, me levantei, com uma coisa em mente.
==Olivia==
Eu estava encolhida no meu quarto, com uma xícara de café na mão, olhando pela janela. Eram apenas 19h e a escuridão já havia caído completamente. Não ajudava que estivesse chovendo.
Suspirei, quase engasgando com o soluço que não soltei. O clima combinava perfeitamente com meus sentimentos. De alguma forma, isso me confortava.
Tomei um gole do meu café puro, uma leve carranca se formando no meu rosto ao sentir o gosto amargo. Papai... sim, eu ainda o chamava de Papai. Ele ainda não tinha voltado e eu não sabia onde ele estava. Eu estava preocupada. Essa era minha fraqueza. Não importava o que alguém fizesse comigo, eu sempre me preocupava com eles. Esse era um lado meu que eu queria muito mudar. Isso me custou muito. Muito que eu não podia mencionar.
Esta tarde, fui ao escritório do xerife para relatar seu desaparecimento. Enquanto estava lá, tive vontade de contar sobre meu problema. Que havia pessoas querendo me possuir, mas não consegui encontrar minha voz. Bem, na verdade, consegui. Contei a um policial, mas quando ele fez mais perguntas, tive um branco. Não sabia como explicar a urgência da situação. Portanto, voltei à estaca zero, pensando em maneiras de evitar essa "captura". Não deixei de me perguntar o que seria de mim se essas pessoas me pegassem. Eles me forçariam a trabalhar na fazenda deles? Ou como empregada doméstica? Ou como prisioneira trancada em algum calabouço? Não pensei muito na última opção, porque, bem, Lyons ou seja lá qual fosse o nome dele não deu essa impressão. Ele não parecia ser alguém que faria isso.
Mas como eu poderia ter certeza? Bati na testa. Aqui estava eu defendendo um estranho. Sim, ele pode não ter tido uma carranca assustadora, pode não ter gritado comigo, mas isso não significava que ele era um santo. O simples fato de que ele... que ele concordou com os termos e condições do Papai mostrava que ele também não era inocente.
Cheirando, fiz menção de tomar outro gole, mas percebi que o café tinha esfriado. Não, isso não era mais para mim.
Fui até a cozinha e despejei o café na pia. Se Papai estivesse aqui, provavelmente me daria a bronca da vida sobre por que desperdiçar comida não era certo. Mas ele não estava aqui e a casa era um cemitério. A solidão gritava.
Eu teria corrido para a casa da Leah. Sim, sem nem pestanejar. Mas eu não podia. Não quando me foi dado o mandato de "pensar nas coisas". Ainda preciso descobrir o que fazer. Como apresentar uma alternativa.
Caminhei sem rumo pelo apartamento enquanto as memórias do passado vinham à tona. Os corredores... eu corria e brincava de esconde-esconde com o Papai. Eu corria pelo corredor sempre que espiava pela janela e via a Mamãe chegando do trabalho.
Meu coração se partiu em mil pedaços ao relembrar isso. A vida nunca mais seria como antes.
Eu não aguentava mais ficar aqui. O tédio era esmagador. Eu precisava ir a algum lugar. Parque, bar, café, qualquer lugar, menos aqui.
Então fui até o meu armário, peguei meu casaco de pele, minhas botas e um gorro. Tranquei a casa e saí. A chuva tinha diminuído para um chuvisco, mas o frio não. Minha pele estava arrepiada mesmo sob a camada grossa de roupas. Achei que poderia me contentar com alguns shots de vodka.
Um pequeno sorriso surgiu nos meus lábios ao pensar nisso. Leah certamente teria levantado a sobrancelha. Sim, era isso que eu tinha me tornado. Uma máquina que desejava álcool.
Caminhei até o bar mais próximo da minha área. A jornada até lá levou cerca de dez minutos, e quando cheguei, já tinha gerado calor suficiente.
Entrei e fiz meu pedido, me afogando na vodka. O bar estava razoavelmente cheio. Acho que eu não era a única que precisava de um ambiente quente e agradável.
Tomei um total de cinco shots e decidi que já era o suficiente. Estava escuro agora, muito escuro. Escuridão total. O chuvisco não tinha parado.
Enfiei as mãos no bolso e comecei a longa caminhada de volta para casa. Minhas pernas, no entanto, tinham se tornado gelatina. Mal podiam suportar meu peso. Mesmo assim, continuei, usando toda a força que tinha para seguir em frente.
Eu estava certa, afinal. O álcool era um inimigo. No entanto, era tarde demais para me arrepender agora. Eu só precisava chegar em casa, e então... talvez. Só talvez, eu pudesse continuar com minhas admoestações.
Continuei andando, contando de 100 a 0. Quase tinha chegado à minha rua quando dois caras me cercaram. Estava escuro, então não consegui ver muito bem seus rostos.
"Com licença?" Eles não se mexeram. Desviei para a esquerda para tentar escapar deles, mas bloquearam meu caminho. O efeito do álcool de repente me deixou.
Virei para o outro lado, pelo menos para correr e tentar voltar ao bar ou algo assim. Mas, surpreendentemente, seus movimentos foram rápidos e num piscar de olhos eles estavam na minha frente.
"Se vocês não me deixarem agora, vou gritar e deixar todo mundo saber que vocês querem me estuprar."
Se minhas palavras tiveram algum efeito, eu não sabia. Esses caras não disseram uma palavra. Não se mexeram.
"Não queremos forçá-la. É do seu interesse vir conosco," disse um deles.
Seu tom era monótono, quase como se ele tivesse ensaiado.
Eu ri. Uma reação causada pela estranheza da situação e pelo efeito entorpecente do álcool.
"Você deve estar louco." Fiz outra tentativa de me afastar deles, mas, como antes, não tive sucesso.
Desta vez, fiquei furiosa. Então eles querem me testar.
Concedido que esta parte da cidade não era segura. No entanto, ainda existiam bons samaritanos. Pessoas que não perderiam um segundo para chamar a polícia se notassem algo estranho ou incomum acontecendo. Aproveitei essa chance e gritei o mais alto que pude. Antes que eu percebesse, uma mão cobriu minha boca. E fui levantada do chão. Gritei mais forte, querendo romper a barreira, mas não teve muito resultado.
Foi assim que me vi sendo puxada para a escuridão. A última coisa que me lembro antes de desmaiar foi...
Casa.