




Capítulo 6
"Eu sempre odiei aquela vadia." Amber enfiou uma uva na boca e mastigou. Seus movimentos de mandíbula eram óbvios e exagerados, mas necessários para projetar completamente como ela se sentia.
"Ele também tem culpa." Mia respondeu. Ela tinha tido uma amiga na vida e essa amiga a traiu. Desde então, sua família era a única com quem ela se abria. Sua irmã se tornou sua melhor amiga e ela não teria de outra forma.
"Eu não esperava isso dele, então não posso dizer que te avisei sobre isso." Amber colocou mais duas uvas na boca.
"O que vocês duas estão conspirando aqui?" O namorado de Amber de cinco anos entrou na cozinha e se aconchegou perto dela.
"Você me ajudaria a esconder um corpo?" Ela voltou sua atenção para ele, com a boca cheia de comida não mastigada.
Ele pressionou o polegar sob o queixo dela como um sinal para ela fechar a boca. "Você vai assustar sua irmã, fazendo-a pensar que perdeu todas as maneiras desde que começou a morar comigo." Ele deu um beijo na testa dela enquanto ela mastigava e engolia.
"Na verdade, dois corpos?" Ela mostrou dois dedos e esperou pela resposta dele. Mia não conseguiu esconder o sorriso no rosto. Ela adorava que sua irmã estivesse recebendo o amor e a atenção que merecia. As duas cresceram sem a mãe. Ela morreu dando à luz Amber. O pai delas tentou o máximo que pôde para criar duas meninas, mas ele não era um homem muito afetuoso.
"Eu devo saber a identidade desses dois corpos?" Ele olhou para as duas mulheres.
"Não olhe para mim." Mia levantou as mãos defensivamente. "Eu nunca disse que queria matar alguém."
"Ah. Por que você não fica com a gente? Podemos pensar no próximo passo depois. Tenho certeza de que Gabriel não pode te impedir de ver Amiyah." Amber segurou as mãos da irmã e apertou.
"Nossa casa nova é um upgrade. Você e Amiyah teriam seus próprios quartos separados." Nathan deu de ombros e sorriu.
"Eu já devo tanto a vocês por cuidarem de Amiyah enquanto estou fora três vezes por semana." Mia deu um tapinha na mão da irmã.
"Falando nisso, eu tenho que ir, minha sessão começa em vinte minutos." Ela olhou para o relógio. "Se acontecer alguma coisa—"
"Nós te ligamos." Nathan e Amber disseram em uníssono.
"Ela nos ama, ela vai ficar bem." Nathan encorajou e Mia saiu da casa deles.
"Engraçado te encontrar aqui." Mia se virou ao ouvir o barítono familiar. Seu pulso acelerou ao ver Harvey Regal de calça de moletom preta e camiseta cinza. Ela ficou subitamente, agudamente consciente de sua própria aparência desleixada.
"Sr. Regal." Ela deu dois passos para trás, seus órgãos sensoriais ameaçando uma sobrecarga. Ela respirou fundo. A magnitude da respiração era algo que ela tinha certeza de que ele notou. No entanto, ele não deu nenhuma indicação de estar ciente disso.
Ninguém tinha o direito de ser tão sexy! Seu subconsciente havia despertado de seu sono de três anos.
"Você não está me perseguindo, está?" Harvey notou que ela recuou e fez uma anotação mental para ter cuidado ao se aproximar de mulheres tarde da noite. Ele não tinha percebido que poderia assustar alguém.
Mia riu sem graça, as imagens de si mesma espionando uma conversa sobre ele ressurgindo em sua mente. Certamente, ela não tinha nada a ver com uma conversa que girava em torno do tema de ser uma potencial perseguidora. Ela não poderia viver com isso em seu subconsciente.
Eu posso. Aquela voz irritante em sua cabeça estava aberta a qualquer coisa não convencional.
"Eu não peguei seu nome da última vez que nos encontramos." Harvey falou novamente. A essa altura, o peso de carregar a conversa o fazia se sentir indesejado. Era uma sensação antiga. Uma que ele não sentia desde que era adolescente. Estava claro para ele que ela não estava interessada em nada do que ele tinha a dizer.
"É Mia Evans." Ela respondeu, apertando a garrafa de água contra o peito. Ela nem percebeu que ele não sabia seu nome. Sentiu-se duplamente tola pela quantidade de atenção que deu a um homem que nem sabia como chamá-la. Embora, não fosse algo que a devesse surpreender. Era óbvio que Harvey Regal não ficava por perto o suficiente para se importar com os pequenos detalhes.
"Este é o seu ginásio?" Ele olhou para o prédio que estava prestes a entrar. Ignorando os sinais de que ela queria escapar dele. Ele não queria que ela fosse embora ainda. Suas bochechas estavam coradas e seu cabelo desarrumado. A visão despertava sentimentos nele.
"É sim." Ela respondeu com um sorriso.
"Não te vi aqui antes." Ele disse a primeira coisa que veio à mente. Não se lembrava da última vez que alguém o fez trabalhar tanto para facilitar uma conversa.
"Os horários não parecem coincidir. Eu acabei de terminar e você parece que está prestes a entrar." Ela respondeu educadamente.
"Um ponto válido." Harvey assentiu. Não havia mais nada que ele pudesse dizer. A conversa havia chegado a um fim natural.
"Você está indo para casa?" Ela já havia começado a dar passos para se afastar.
"Na verdade, depois de uma sessão de treino, geralmente vou tomar um café naquela cafeteria ali na esquina. Esse é meu espaço seguro." Seus olhos se iluminaram e sua voz carregava emoção. Ele se lembrou do porquê não conseguia tirá-la da cabeça. Eram esses pequenos momentos em que ela ousava se mostrar em vez de ser uma simulação básica.
"Tenha um bom dia, Sr. Regal." Ela disse, virando nos calcanhares. Foi a decisão de Mia se afastar, afinal, ela não sabia o que dizer a Harvey.
Harvey gemeu internamente. Mia estava se afastando dele e ele não conseguia encontrar em si mesmo a força para deixá-la ir. "Mia!" ele chamou por ela.
Mia se virou. Alívio e terror lavando sobre ela em partes iguais enquanto olhava para Harvey caminhando em sua direção.
"Você se importa se eu te acompanhar?" ele estava perigosamente perto dela.
Mia olhou em todas as direções. "Você não estava prestes a malhar?" seus olhos se arregalaram.
"Ah, é dia de perna. Não sou fã." Ele rebateu. "Além disso, não acho que um dia vá me atrasar muito." Ele deu de ombros e os olhos dela estavam cheios de seus bíceps à mostra. Vê-los delineados em duas camadas de tecido não era nada comparado à visão que ela tinha agora.
"Não sei se isso é uma boa ideia. Eu sou a professora da sua irmã." Por que você está dando motivos para ele ir embora? Sua consciência gritava.
"É por isso que você tem estado tão ansiosa para fugir ao me ver?" Harvey percebeu que a falta de atenção provavelmente tinha menos a ver com ele e mais com os problemas internos dela.
Ansiosa para fugir ao vê-lo? Mia queria rir do mal-entendido. Ela se via atraída por esse homem. O simples pensamento dos dedos dele a mantivera acordada nas últimas noites e ela não podia acreditar que ele pensava que ela queria evitá-lo. Pelo menos, ela estava aliviada que ele não adivinhou corretamente o motivo de sua aparente falta de interesse.
"Não tenho certeza se isso resultaria em algum problema." Ela jogou junto. Essa era uma narrativa melhor para ele acreditar.
"Se você é capaz de separar sua vida pessoal da profissional, então não vejo problema." Ele comentou. "Isso, é claro, é sua decisão. Eu obedecerei felizmente." Havia um brilho perigoso nos olhos dele e Mia duvidava que esse homem já tivesse obedecido a uma única pessoa na vida.
Nós estaríamos dispostas a obedecê-lo, no entanto.
Ela afastou o pensamento escandaloso e sorriu. "Então me siga."
"Feliz." Ele respondeu e acompanhou o passo dela. Mia se sentia eufórica, a presença de Harvey ao seu lado parecia natural. Fazia muito tempo que ela não ficava tão próxima de um homem e se sentia segura.
"É essa cafeteria bem aqui." Ela apontou e eles entraram. Harvey segurou a porta para ela e ela sorriu de forma desajeitada.
"Onde você quer sentar?" Harvey olhou para ela. O coração de Mia disparou. Ela mal notou quais mesas estavam vazias e quais estavam cheias. Seus sentidos estavam preenchidos com outras sensações.
"Um lugar perto da janela?" Ela sugeriu. Era sua rotina habitual sentar perto de uma janela e olhar para o mundo sempre que estava sozinha. Algo lhe dizia que isso não era uma opção desta vez.
"Tem uma ali." Ele segurou o pulso dela, a sensação da palma dele contra sua pele nua era quente. O toque dele enviou ondas de calor subindo e descendo pelo braço dela, todas irradiando daquele ponto central. Ele a conduziu até uma mesa.
Mia não podia ignorar os olhares que ele recebia. Mulheres viravam a cabeça abertamente enquanto ele passava, rindo e cochichando com suas amigas.
"É sempre assim?" Mia não conseguia tirar os olhos de algumas dessas mulheres enquanto se sentava de frente para Harvey.
Harvey seguiu a linha de visão dela e imediatamente voltou a olhar para ela.
"Acho que você vai ter que me recomendar algo desse cardápio, já que essa é sua escolha." Ele ignorou completamente a pergunta e a enorme quantidade de atenção que estava recebendo.
Mia deixou o assunto de lado. Ela discutiu suas bebidas favoritas e eles fizeram o pedido assim que o garçom chegou.
"Então, como você passa seu tempo livre? Além de tentar intimidar meninos de doze anos, é claro." Ela envolveu as mãos ao redor de si mesma. Seu pulso ainda latejava do toque dele. Ela tentou focar sua atenção em outra coisa.
"Uau, isso me pegou rápido, hein?" Ele limpou a garganta. Seus olhos estavam fixos nos lábios dela. Ela tinha o hábito de mantê-los em uma linha reta, controlados e rígidos. Ele estava começando a perceber que todas as emoções dela se acumulavam nos olhos.
"Acho que às vezes as linhas entre o pessoal e o profissional se sobrepõem." Ela retrucou, e ele sorriu.
"Às vezes, sou audacioso demais em uma situação." Sua melhor aposta era admitir que tinha sido muito direto ao pensar que suas demandas seriam atendidas.
"Bem, você sabe o que dizem, o primeiro passo para resolver um problema é reconhecer que ele existe." Ela inclinou a cabeça para o lado. "Ainda pode haver esperança para você, Sr. Regal." Ela estendeu a mão e o tocou. Ela se arrependeu no momento em que a palma da mão cobriu os nós dos dedos dele. Todo o corpo dele ficou imóvel e a cabeça abaixou. O humor em suas veias dissipou-se e foi substituído por autoaversão.
Ela lentamente tentou retirar a mão, mas ele virou o pulso e agora estava segurando-a. Mia prendeu a respiração.
"Prefiro Harvey. Todo mundo chama meu pai de Sr. Regal, soa estranho para mim." O polegar dele começou a fazer círculos na mão dela.
Mia assentiu. Incapaz de pensar ou respirar.
A mesa começou a vibrar e Mia instantaneamente puxou a mão de volta e verificou sua bolsa. "É meu." Ele declarou. "Com licença." Ele disse, atendendo a ligação.
"Você está brincando comigo?" Ele se recostou na cadeira, jogou a cabeça para trás e riu.
"Eu te disse, tio Scott, que aquele carro não duraria uma semana." Mia podia sentir o orgulho na voz dele. Ela não conseguia tirar os olhos dele.
"Vou te buscar. Mamãe e papai estão no encontro deles, ele não vai atender nenhuma ligação." Ele riu novamente, lembrando ao interlocutor de enviar a localização. Ele desligou o telefone e o enfiou no bolso.
"Desculpe, meu tio comprou esse carro antigo e teve a ideia ridícula de que ele funcionaria sem um pouco de cuidado. Tenho que ir buscá-lo." Harvey explicou, mas não fez nenhuma tentativa de sair.
"Meu Deus!" Mia exclamou. "Ele está bem?"
"Ele está bem." Harvey riu. "Provavelmente ficou sem gasolina ou algo assim. Tenho certeza de que nenhum dos medidores é preciso."
"Eu realmente sinto muito, me sinto mal por sair." Ele se inclinou mais perto dela. A mesa era a única barreira entre eles. "Não é problema. Seu tio precisa de você." Ela o tranquilizou.
"Posso te dar uma carona para casa?" ele ofereceu.
"Não, eu gostaria muito de aproveitar meu tempo tranquilo aqui um pouco antes de ir para casa." Ao mesmo tempo, os pedidos chegaram.
Harvey pegou o dele para viagem, pagando a conta apesar da fervorosa desaprovação de Mia. Ele deslizou para fora do assento e olhou para ela. Ela lhe deu um sorriso caloroso.
"Você gostaria de me ver de novo, Mia?" ele perguntou, observando o sorriso lentamente se transformar em uma linha reta.
"Eu-uh." Ela não sabia como responder.
Diga sim, sua tola indecisa! Sua consciência já estava farta de sua indecisão.
"Você não precisa responder agora." Ele puxou um guardanapo da mesa, procurou uma caneta na bolsa e escreveu seu número. "Para quando você decidir." E ele se foi.