




Capítulo 7 - Morte por café
Com uma forte convicção de buscar a verdade, Solene decidiu visitar o supermercado e pedir para ver as câmeras de segurança do prédio, especificamente durante os tremores.
Havia uma filmagem, sim, mas ela só mostrava imagens antes de o tremor começar. Solene não poderia estar mais desapontada quando o vídeo parou bem quando ela e AC estavam prestes a se aproximar da prateleira de Nutella.
"Uma falha técnica", explicou o gerente, mas Solene não acreditou. Era coincidência demais. Algo em seu instinto lhe dizia que era intencional. Quanto ao porquê e quem fez isso, eram as duas perguntas que preenchiam sua mente.
No final, ela voltou para casa com mais perguntas do que respostas, e essas dúvidas persistiram até o dia seguinte.
Logo de manhã, Solene se encontrou com sua parceira de tese e melhor amiga, Myrna — uma ruiva com um corte bob curto e cílios grossos. Elas escolheram seu café favorito fora da Universidade, o Café Tiala. Infelizmente, a loja estava lotada de clientes, então as duas tiveram que esperar na fila para fazer seus pedidos.
Enquanto ouvia sua amiga falar, Solene avistou um rosto familiar entre a multidão de clientes. Ela sibilou silenciosamente quando percebeu quem era.
"Com licença, Myr. Preciso fazer uma coisa. Guarda meu lugar para mim, por favor?" disse ela.
Sua amiga franziu a testa e, antes que pudesse responder, Solene já estava caminhando diretamente para a pessoa sentada tranquilamente em um canto aconchegante do café.
"Coincidência de novo?" Solene colocou as mãos na cintura enquanto seus olhos se estreitavam ao ver ninguém menos que Hein Masters.
Ele não levantou o olhar. Seus olhos continuaram fixos no jornal que segurava, mas ele riu levemente e fez um som de hum profundo na garganta.
"Essa é uma maneira bem estranha de iniciar um assunto com um estranho."
O maxilar de Solene se tensionou.
"Não, não estou tratando você como um estranho mais, Sr. Masters. Mais como um perseguidor."
"Perseguidor?" Ele arqueou uma sobrancelha e então lançou um olhar repreensivo para ela. "Mulher, isto é uma cafeteria. Qualquer um tem a liberdade de entrar neste lugar. Eu incluso."
Solene, ao ouvir isso, foi pega de surpresa. Ela soltou um suspiro pesado e desviou o olhar para o chão.
Ele tinha um ponto, ou talvez fosse apenas seu álibi? Ela não queria acrescentar que este era seu café favorito. Que ela vinha aqui praticamente todos os dias desde que estava no ensino fundamental. Essa informação era óbvia para qualquer perseguidor que tivesse pesquisado bem sobre ela.
Ou talvez, ela estivesse apenas ficando paranoica.
"Por favor," a voz de Hein interrompeu seus pensamentos e isso a fez olhar para cima, "sinta-se à vontade para sentar." Seus olhos percorreram de um lado para o outro e depois além dela, para a multidão de clientes. "Parece que não há vagas," ele comentou. "Você pode até convidar sua amiga para se juntar a nós."
Solene estava quase tentada.
"Não, obrigada," ela respondeu, com a voz monótona, e então se virou, com a intenção de voltar para onde sua melhor amiga estava.
"Como quiser," ela ouviu ele dizer por trás. Ela torceu os lábios, resistindo à vontade de responder. Não queria causar nenhuma cena. Ela admitiu. Sentiu-se um pouco envergonhada por acusá-lo assim, mas ele não podia culpá-la. Seus encontros consecutivos eram demais para o seu gosto.
"Juro que se eu ver esse homem de novo, vou chamar a polícia," ela murmurou para si mesma enquanto se afastava.
Perto do caixa, Myrna inclinou a cabeça para o lado, seus olhos se estreitando.
"Hmmm, quem é aquele pedaço de mau caminho?" ela perguntou assim que Solene se aproximou.
Solene resistiu à vontade de olhar para o homem, mas sua melhor amiga estava se divertindo admirando-o. Ela realmente não se importou em esconder isso.
"Não faço ideia," Solene respondeu, mordendo o interior da bochecha. Pelo canto do olho, ela viu um casal deixar a mesa. Foi o momento perfeito. Ela imediatamente puxou sua melhor amiga para a vaga.
"Mas você estava falando com ele," Myrna chamou por trás dela, agora caminhando em direção às cadeiras elegantes. Ela olhou na direção de Hein e definitivamente o pegou olhando para elas, ou mais para Solene, que acabara de se sentar. Myrna não conseguiu esconder um sorriso que se formou em seus lábios.
Solene, por outro lado, gemeu. "Vamos começar com nosso planejamento, Myr, por favor."
Myrna deu de ombros. "Tá bom, alguém está meio avarenta hoje."
Solene não respondeu ao comentário dela. Ela tirou seu caderno de anotações e uma caneta da bolsa e os colocou na mesa. Sua melhor amiga fez o mesmo, além de duas pastas plásticas, uma branca e outra cinza.
Uma hora depois, Myrna acenou com a mão entre elas.
"Ei, você está me ouvindo?" ela disse, quase perdendo a paciência.
Solene piscou várias vezes enquanto limpava a garganta.
"Sim, uhmm, sim, estou ouvindo, Myr. Acho que se o Professor Hadley nos der tempo, então—"
"Você estava de olho nele, não estava?" Myrna chamou, mexendo as sobrancelhas e sorrindo.
Solene respondeu rapidamente, "Não." Ela direcionou os olhos para o caderno de anotações e fingiu que estava lendo.
"Admite, Lee," Myrna chutou os dedos dela por baixo da mesa. "Seus olhos estão dizendo o contrário. Estou falando aqui há uma hora e sua atenção está em outro lugar."
"Eu não estou de olho nele, tá?" Solene respondeu, tentando arduamente manter a voz baixa. "Estou apenas cautelosa. Sinto que há algo sobre esse homem. Ele parece estar me seguindo há dois dias, mas quando o confronto como um perseguidor, ele nega. Ou bem, ele não exatamente 'negou', mais como se me ignorasse."
Ela optou por não dar mais detalhes. Era melhor que sua melhor amiga permanecesse felizmente alheia à sua experiência no supermercado e à conversa deles na biblioteca.
"Pft. Você está exagerando, Lee," Myrna riu. "Se alguém como ele me perseguisse, eu já estaria na mesa dele flertando e pedindo o número dele no processo. Ele não tem cara de perseguidor. Ele é mais como um guarda-costas ou algo melhor."
Solene fez uma careta. "Não julgue o livro pela capa, Myr, você já ouviu esse ditado?"
"Só quando o livro não está no Wattpad," sua amiga retrucou.
Solene revirou os olhos para o céu. "Myr, estou falando metaforicamente."
"Sim, eu sei," ela suspirou. "Olha, meu ponto é, dê uma chance ao cara. Apenas fale com ele direito. Investigue. Você é uma mulher inteligente. Você é uma aspirante a psicóloga, pelo amor de Deus. Analise ele."
E Solene estava planejando fazer isso, sim, mas ainda estava impressionada com a franqueza de sua melhor amiga.
"Uau. Você sabe que eu te amo, né?" ela disse enquanto sorria.
"Garota, desde o jardim de infância," Myrna balançou a mão entre elas. "Sério, levanta dessa cadeira agora ou eu vou—"
"SAIAM DA FRENTE!"
Um grito ensurdecedor de uma mulher do outro lado da mesa interrompeu Myrna.
Tudo aconteceu tão rápido que Solene só conseguiu registrar uma caminhonete vindo em direção a elas da rua. A próxima coisa que ela soube foi que estava sendo empurrada para o chão e então sentiu um corpo forte a protegendo do impacto. Ela deveria sentir medo, até se preocupar com sua vida, mas naquele instante, ela se sentiu protegida.
Ela ouviu um gemido de um homem atrás dela, achou familiar até, mas não conseguiu se aprofundar nesse fato enquanto mais barulhos invadiam seus ouvidos.
"AHHHHH!"
Ela ouviu gritos por toda parte e então um som alto de metal batendo no concreto.
Cacos de vidro caíram no chão. As mesas e cadeiras tombaram. Alguns clientes estavam no chão com as cabeças cobertas pelos braços enquanto outros apenas ficaram parados, atônitos.
Solene, por instinto, fechou os olhos e se encolheu em posição fetal. Ela não tinha certeza do que estava acontecendo, mas sabia que estava no epicentro de um acidente de veículo.
Segundos depois, tudo ficou em silêncio.
O peso que a empurrava desapareceu. A sensação de segurança a deixou e, desta vez, por mais louco que parecesse, ela realmente se sentiu vulnerável.
Solene abriu os olhos lentamente. Com o rosto em contato com o chão, ela se empurrou para cima e examinou a cena. Acontece que todos os olhos estavam nela. Atrás dela, a alguns centímetros de distância, estava a caminhonete, suas rodas quase alcançando o teto.
"Solene!" Myrna gritou, correndo para o lado dela da multidão de testemunhas.
"Myr—na?" Solene olhou para cima. "Você está—bem?"
"Sim! Sim, estou. Fui puxada por um grupo perto da nossa mesa a tempo, mas você! Você está bem?! Está machucada em algum lugar?!"
Myrna agarrou seus ombros e examinou todo o seu corpo de cima a baixo.
"A caminhonete literalmente passou por você! Tem alguma coisa doendo?!"
Solene olhou para o veículo. Ele definitivamente sofreu grandes danos. Se fosse por qualquer coisa, ela poderia até estar morta agora se não fosse por...
"Não..." ela respondeu, franzindo a testa. "Nada." Sua mente tentou juntar os eventos anteriores.
"Precisamos te levar ao hospital para ser examinada, só para ter certeza," Myrna afirmou freneticamente. Ela verificou e tocou Solene novamente, certificando-se de que ela estava realmente ilesa.
Solene não se importou. Sua cabeça estava em outro lugar. A voz de sua melhor amiga se afinou enquanto ela se lembrava do momento em que a caminhonete veio em sua direção. Se ela não tivesse sido empurrada para o chão para realmente desviar, ela estaria morta. Ela também tinha certeza de que algo a protegeu dos destroços. Algo ou alguém, nesse caso.
"Solene?" Myrna sacudiu seus ombros para capturar sua atenção.
Solene limpou a garganta e piscou antes de responder. "Não, estou bem, Myrna. Não preciso de hospital. Não fui atingida em lugar nenhum."
"Mas você tem sangue nas costas da sua blusa," Myrna apontou preocupada.
Solene olhou por cima do ombro e viu algumas manchas vermelhas em sua blusa bege, como sua melhor amiga havia dito. Uma ruga se formou em sua testa.
"Não, isso é... isso não é meu..." ela afirmou, certa de si.
"Bem, você deveria se examinar de qualquer maneira," Myrna insistiu. Ela guiou Solene para cima e a apoiou assim que ela conseguiu ficar de pé.
"De verdade, Myrna, estou bem. Só preciso ir para casa e trocar de roupa." Os olhos de Solene se moveram inconscientemente para onde Hein estava sentado. A mesa e as cadeiras não foram afetadas pelo acidente, mas ele não estava mais lá.
'Onde ele está?' ela pensou.
Ela se moveu para verificar as pessoas ao seu redor. Algumas tinham a urgência de sair do café enquanto outras permaneciam, estudando os danos, registrando sua experiência aterrorizante nas redes sociais e algumas verificando se o motorista da caminhonete estava bem.
Sons de sirenes foram ouvidos nas proximidades e ela observou, através da parede de vidro quebrada, a chegada de ambulâncias e carros de polícia.
No meio dessa cena agitada, o que imediatamente chamou sua atenção foi a visão de um homem, especificamente Hein, parado do outro lado da rua, olhando fixamente para o café, diretamente para ela, enquanto cuidava de um corte sangrento em sua bochecha.
'Como ele chegou tão rápido do outro lado da rua?' essa foi a primeira pergunta que surgiu em sua mente. A segunda foi sobre o ferimento que ele recebeu. Claramente, veio do acidente de veículo, mas como ele teria recebido tal ferimento se o lugar onde ele estava no café permaneceu praticamente intocado?
Cacos de vidro possivelmente o atingiram. Essa é uma explicação plausível. Pode ser. Definitivamente.
Ainda assim, por que uma parte dela acreditava que ele era a pessoa que a salvou do acidente?
Havia apenas uma maneira de descobrir.